A notícia de que a Assembleia gaúcha aprovou uma lei contra “o preconceito e a discriminação” dos homossexuais merece algum exame.
A Constituição e o Código Penal já contêm garantias suficientes contra qualquer tipo de discriminação que venha a ser sofrida por cidadão brasileiro. Especificar essas garantias para uma classe em especial ou é uma redundância, ou tem uma intenção embutida que vai além da mera salvaguarda de direitos óbvios. Neste último caso, ela confere a determinado grupo um privilégio que os outros não têm. A consequência é óbvia: o homossexual, protegido de críticas à sua conduta erótica, está livre para criticar à vontade o religioso cujas escrituras sagradas condenem explicitamente essa conduta.
A especificação nada acrescenta à proteção do homossexual, mas legitima a discriminação do religioso. É claro que isso não estava na intenção dos deputados gaúchos. Eles simplesmente seguiram a moda e a mídia, sem examinar as fontes intelectuais da idéia que absorveram e, portanto, as consequências de mais vasto alcance que serão geradas pela sua conversão em lei.
Os pretensos “direitos dos gays” são parte de um vasto front cultural aberto por intelectuais ativistas numa nova estratégia de combate inspirada na Escola de Frankfurt, no filósofo marxista húngaro Gyorgy Lukacs e em Antonio Gramsci. O fundamento da estratégia é a máxima de Lukacs de que a destruição da democracia capitalista requer, antes, a demolição das bases morais e intelectuais da civilização ocidental. A principal dessas bases é a ética judaico-cristã, bombardeada de todos os lados e sob uma impressionante variedade de pretextos, de modo que a opinião pública, cada vez mais alerta para pequenos arranhões no orgulho gay, lésbico, feminista, etc., está completamente dessensibilizada para o fato brutal das perseguições religiosas, hoje mais intensas do que nunca.
Michael Horowitz, historiador judeu, o mais informado pesquisador na área, informa que pelo menos 150.000 cristãos são assassinados anualmente pelas ditaduras comunistas e muçulmanas — enquanto, indiferente a isso, o Ocidente se ocupa de dar força de lei a caprichos e pretensões grupais concebidos para criar hostilidade à religião e anestesiar a sensibilidade do público ante a gravidade do genocídio continuado.
A bibliografia existente sobre o assunto é vasta, mas permanece fora do alcance do nosso público. Vale consultar, no mínimo, Judith Reisman (Kinsey: Crimes and Consequences), E. Michael Jones (Libido Dominandi: Sexual Liberation and Political Control) e Daniel Flynn (Why The Left Hates America), bem como o número especial da revista Whistleblower dedicado a “The Gay Rights’ Secret Agenda”.
A estratégia é implementada por uma tática, também bastante conhecida.
Primeiro: Algum subintelectual a serviço de partido, grupo de interesse ou ONG levanta uma hipótese pseudo-científica rebuscada e caluniosa que, mal termina de ser formulada, já se alardeia na mídia como verdade provada e moralmente obrigatória.
Segundo: Qualquer tentativa de discuti-la é recebida com tamanhas manifestações de escândalo que o possível contestador perde o embalo de continuar pensando no assunto, por medo de ser chamado nazista, racista, homofóbico, etc.
Terceiro: Com base na hipótese, tiram-se conclusões e aplicações para vários domínios do conhecimento e da ação, começando pelo estabelecimento de novos critérios para o julgamento de questões morais, históricas, políticas, etc., e terminando pela promulgação de novos códigos que dão a esses critérios o estatuto de obrigações legais.
Quarto: Você mal acabou de tomar conhecimento do assunto e pensa em dizer algo a respeito, quando de repente percebe que ao fazê-lo não estará enfrentando um debate acadêmico ou jornalístico, e sim uma queixa policial.
A fórmula é: escamotear o debate. Não dar tempo para ninguém pensar. Esmagar os contestadores, não com argumentos, mas com insultos, com reações histéricas de indignação e, se possível, com processos judiciais. Saltar direto da expressão de uma vontade à ação que a impõe como fato consumado. A tática é denunciada com impiedoso realismo por uma líder feminista, lésbica, apenas sincera demais para ser cúmplice de tanta perfídia: leiam The New Thought Police, da linda e corajosa Tammy Bruce.
Tal é, em essência, o sentido da “ação afirmativa”.
Você não encontrará essa definição em nenhum panfleto gay, neo-racista, lésbico, indigenista ou ecológico. Dirão apenas que se trata de políticas piedosas destinadas a compensar os danos que a sociedade infligiu a grupos minoritários ou à pobre Mãe Natureza. Mas, em boa lógica, a definição que descreve uma política tão-somente pelos seus elevados objetivos professos, fazendo abstração do modo de agir concreto destinado a atingi-los, não é definição: é propaganda.
Substantivamente, a ação afirmativa é esquema de transformação social adaptado da tática de “ação direta” preconizada por Georges Sorel, teórico da violência no socialismo e no fascismo. Seus inventores bem sabem disso, mas a massa dos militantes contenta-se com a definição eufemística, condenando como odiosa manobra reacionária qualquer tentativa de exame das ações concretas. O apelo à camuflagem, a recusa de submeter-se a critérios objetivos de veracidade e moralidade, já comprovam que os altos propósitos alegados por esses movimentos são mentirosos até à raiz.
No fundo, o que está em jogo não é a proteção dos negros, nem dos gays, nem das mulheres, nem da Mãe-Terra nem de quem quer que seja. Tudo isso é apenas pretexto de ocasião para promover o antiamericanismo, o ódio à civilização judaico-cristã e o embelezamento de regimes ditatoriais e genocidas.
A prova mais eloquente da total insinceridade desses movimentos é a pressa indecente com que abdicam de suas metas e aderem às políticas contrárias sempre que isso convenha à estratégia maior do esquerdismo internacional. O movimento gay norte-americano, que vive ciscando casos reais e imaginários de discriminação em toda parte, fez o diabo para proibir a exibição de filmes sobre a perseguição anti-gay em Cuba, país onde a repressão oficial aos homossexuais chega a requintes que nem Stálin teria imaginado. Com igual descaramento, na passeata anti-EUA e anti-Israel de 20 de abril de 2002 em Nova York, líderes feministas enragées manifestaram seu apoio irrestrito às ditaduras muçulmanas, os regimes mais machistas que já existiram no universo.
Tudo isso sugere uma pergunta dolorida: Terá valido a pena o Rio Grande livrar-se do governo petista, se for para ceder tão docilmente, por inocência intelectual, ante as exigências mais gerais da ideologia que o inspirava?
Publicado na edição de 29 de Dezembro de 2002 de Zero Hora