Histórico:
Lá pelos anos 60 a Indústria Bélica Nacional surgiu efetivamente com a empresa ENGESA, que iniciou suas atividades fornecendo equipamentos para perfuração de poços de petróleo e, em dado momento, aceitou adaptar caminhões para uso fora de estrada. Isso porque a entrega de seus equipamentos nos locais de perfuração era um grande e complexo desafio. Esse produto chamou a atenção do Exército Nacional, que encomendou várias unidades. Em seguida as soluções mecânicas de sucesso foram transferidas para viaturas blindadas, dando início a uma longa e profícua parceria. Daí por diante a história dessa empresa se notabilizou por: rápido crescimento, até atingir um porte empresarial bastante significativo; sucesso comercial no exterior, com tecnologia competitiva e volumes de exportações extraordinários para os padrões da época, mesmo os internacionais; montagem de uma estrutura técnica e tecnológica impressionante para os padrões nacionais; capacidade física de equipar o exército brasileiro com sobras em qualquer eventualidade que surgisse.
Cenário Atual:
Após o fechamento da Engesa e o encolhimento substancial da Avibras (que sempre se ateve a um tipo restrito de armamento e quebrou recentemente), restou no mercado nacional um punhado disperso de empresas de porte mediano, ou pequeno, além de algumas fornecedoras multinacionais, todas agindo de forma oportunista no atendimento de eventuais editais emitidos pelo EB, que não tem trabalhado em prol da formação de um supridor preferencial, espaço antes ocupado pela Engesa e, secundariamente, pela Avibras.
Para comparação, a Força Aérea seguiu rota diferenciada, a partir de um casamento de interesses com a Embraer, que se prontificou a participar de todos os suprimentos de material bélico à FAB nos últimos 30/40 anos.
De outra forma, a Marinha tem dado prioridade especial ao uso de estaleiros próprios para atendimento de suas necessidades de equipamentos bélicos, integrando tecnologias de licenciadores internacionais com sua própria engenharia.
Como consequência da política de licitações públicas do EB, temos exemplos recentes de fornecimentos de equipamentos apenas mediocremente condizentes com os requisitos mínimos apostos nos editais, como por exemplo:
No caso dos blindados Guarani, ficou evidente a ênfase exigida na proteção a minas e a projeteis, mas faltou apuro nos quesitos mobilidade, desempenho, perfil de linha de tiro, navegabilidade, itens que ficaram pobremente cobertos. Já no caso das viaturas VLEGO para lançamento por paraquedas há informações de que o fornecimento não conseguiu atingir a meta proposta de desempenho e os protótipos foram enviados para mais um pequeno fornecedor na tentativa de implementar as melhorias necessárias. Quanto aos Jeeps, não há mais um equipamento padrão, o que complica toda a lógica de manutenção das frotas.
Uma outra consequência atrelada à atual política do EB é a dispersão do know-how em várias empresas insuficientemente estruturadas técnica e financeiramente, o que empobrecerá cada vez mais a qualidade dos fornecedores nacionais, favorecendo a dependência de fornecedores estrangeiros. Empresas chinesas já começaram a participar de algumas licitações, o que não é um bom presságio.
Aprendizado:
Lições do passado são sempre necessárias. Devemos então avaliar o que representou a Engesa para o país.
O sucesso da empresa trazia embutidas algumas características que deveriam servir de paradigma para a eventual formatação de uma futura empresa que se proponha a atender esse mercado. Uma delas era o atendimento além das expectativas das especificações técnicas dos editais de compras dos ministérios.
Pode-se citar como exemplo a iniciativa de desenvolvimento das chapas blindadas bi-metálicas (que envolveu diversas contribuições, inclusive de pesquisadores da USP), com tecnologia que resultou em solução leve e muito eficaz para os padrões da época. Ou a introdução da suspensão traseira em “boomerang”, transferida dos caminhões especiais Engesa para o projeto dos EE-9. Ou a instalação de canhão 90mm em viaturas EE-9, uma iniciativa exclusiva da empresa para ofertar o produto no exterior, depois adotada pelo EB. Houve também o desenvolvimento do EE-11 com ótimas características de capacidade, navegabilidade, blindagem, mobilidade etc. Destaque-se também a aplicação massiva de tecnologias de ponta para o projeto do EET-1 Osório, superando e surpreendendo a todas as expectativas do EB.
Tudo isso se materializou a partir da montagem de uma base tecnológica sólida com a criação da ENGEPEQ, que empreendeu a contratação de equipes de engenheiros/pesquisadores em várias especialidades, investiu em laboratórios de P&D e empreendeu a proposição de projetos conceituais e novos produtos
A empresa também buscou a diversificação de atividades e produtos com sinergia com as linhas militares, que ensejariam uma maior estabilidade de entrada de recursos para a empresa (ação que não atingiu seus objetivos plenamente)
Recuperação do “know-how” Engesa:
O corpo técnico da Engesa era muito jovem na época do seu auge, sendo que vários desses antigos funcionários ainda estão em atividade e carregam consigo valiosos conhecimentos que poderiam ser apropriadamente coletados. Seria o caso de se propor a constituição de uma empresa de porte, com largo trânsito junto às áreas técnicas do exército, que promoveria a oportuna formação de um “Comité Técnico” baseada nessas dezenas de profissionais com larga experiência na área, que teria a incumbência de selecionar, treinar, orientar e avalizar/certificar a formação de um novo grupo de engenheiros e técnicos para a nova empresa.
Em torno desse núcleo detentor de bagagem técnica, crucial para o correto desenvolvimento de uma indústria competente, pode-se estruturar um empreendimento que poderá desempenhar adequadamente suas funções de atendimento às demandas do EB, desde que dadas as condições financeiras necessárias.
O grupo que poderia compor esse Comité Técnico é bem maior do que pode supor inicialmente, pois apenas uma pequena fração dos antigos funcionários das áreas de tecnologia da finada Engesa mantiveram-se nas empresas supridoras do EB surgidas após seu fechamento.
Vários deles hoje são empresários, ou consultores, ou gerentes, diretores e CEOs de empresas em vários ramos de atividades, além de uns poucos aposentados. Dessa população, será possível garimpar um grupo de profissionais altamente especializados que se disporiam a compor esse Comité.
Visão de futuro:
O Brasil é um país continental, o que determina a necessidade de suprimento próprio de recursos bélicos e de toda tecnologia neles contida.
Faz-se necessário, indubitavelmente, melhorar o status da lógica de suprimentos do EB hoje existente. Estranhamente, muito provavelmente nosso país é o único que já dispôs desse recurso e o perdeu. Seria necessário que grupos investidores promovessem um aporte de capitais substancial para este empreendimento, com a participação do governo federal como garantidor ou avalista do sucesso do “start-up” da empresa. Não seria o caso da criação de mais uma estatal, por outro lado, seria um exercício extremamente complicado criar uma empresa para suprimento tão exclusivo sem o aval do principal cliente.
Formou-se um grupo em torno dessa ideia e foram dados os primeiros passos nessa direção. Contamos com o apoio com todos que aprovam essa iniciativa.