Quiseram as circunstâncias que minhas andanças pelo México começassem por Querétaro, uma bela cidade, que em muitos momentos foi protagonista na história do país. De uma forma absurdamente extemporânea, a França de Napoleão III implantou Maximiliano da Áustria como Imperador do México. Apeado da presidência, Benito Juárez, apoiado pelos EUA, acabaria por vencer Maximiliano e o fuzilariam em 1867, no Cerro de Las Campanas, em Querétaro. Curioso que Benito tenha aceitado a ajuda dos norte-americanos, que haviam conquistado metade do México na guerra de 1849: Texas, Nuevo México, Arizona, California, Utah, Nevada e parte do Colorado. A bandeira do México tem no centro uma águia, mas a história mostrou que a águia do Tio Sam rapina com mais apetite.
Sob Porfirio Diaz, que comandou o país por mais de trinta anos, o México se industrializa, mas passa a depender de seu vizinho do norte. Em 1910, com o descontentamento campesino e a luta por eleições livres, Madero lidera uma revolução e em 1911 derrota Diaz. Zapata e Pancho Villa não aderem e em 1913 Madero é assassinado. Huerta assume o poder. Renuncia pouco depois e Carranza assume, mas é assassinado em 1920 e estoura a guerra civil. Como se vê o México tem uma história de violência política pra ninguém botar defeito.
Em 1917 os representantes políticos se reúnem em Querétaro e proclamam a nova constituição, que perdura até hoje. No museu local, no qual está exposto o caixão usado por Maximiliano logo após o fuzilamento, pude respirar um pouquinho da história deste grande país, marcado por enorme diversidade étnica, mas normalmente identificado com os astecas, vencidos por Hernán Cortés em 1521.
Visitar Tenochtitlan, hoje Cidade do México, por conta das atrações culturais e sua ótima culinária de rua, é um privilégio. O povo é gentil, a cidade é muito limpa e razoavelmente segura, ainda que à custa de um aparato policial ostensivo: à entrada de centros comerciais populares é comum ver agentes de segurança com submetralhadoras. Seja como for, me aventurei por todos os cantos, começando pelo Museu de Antropologia, um dos mais extraordinários que já visitei. Um banho de cultura, que mal aproveitei em decorrência de minhas lacunas, mas algo fica.
Estou a concluir a obra “A conquista da América Latina vista pelos índios”, do antropólogo Miguel Leon Portilla, que também recuperou uma antologia poética na língua náuhatl. Versos ingênuos, ressuscitados por pesquisadores de várias áreas. Astecas e Maias não tinham escrita, apenas representações pictóricas ou glifos, que de alguma forma nos remetem aos hieroglifos.
O livro mencionado confirma que Montezuma ficou inseguro quando soube da chegada dos europeus. Tivera inúmeros presságios funestos e chegou a pensar em fugir. Quando encontra Hernán Cortés o presenteia e tudo indica que o tratou como se Hernán fosse Quetzalcoátl, uma divindade asteca. Cortés se faz de rogado, tranquiliza Montezuma e não desmente.
Além da posse de cavalos, indumentária guerreira e canhões, o hábil Cortés estabelecera uma aliança com um povo inimigo dos astecas, os tlaxcaltecas, que viviam sob o jugo de Tenochtitlan. Mais uma vez a história revela como fica mais fácil derrotar um território invadido se a discórdia estiver semeada, aproveitando, com astúcia, a cizânia. Os tlaxcaltecas colaboram imaginando-se aliados dos espanhóis, não como seus súditos.
É muito comum atacar os espanhóis e a Igreja pelo que aconteceria com a cultura aborígene, mas devo confessar que tudo que tenho visto de mais belo – como as construções sólidas de dois pisos e seus balcões, templos, escolas e seminários católicos, arrestados em alguns períodos da história pela Ilustración,- tem identificação com os espanhóis e com a Igreja.
Os aborígenes, visivelmente pobres, seguem nas ruas, vendendo seus produtos. O Estado laico não os incorporou, como prometera. Quanto à economia, o México vive um período de alguma estabilidade, beneficiando-se da Alca e do Tratado de Livre Comércio da América do Norte, mas segue dependendo de investimentos estrangeiros. Que aqui aportam como sacerdotes do evangelho da prosperidade. Em certo sentido Cortés está de volta.