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Coisas novas e respostas antigas

  • Setembro 2, 2022
  • Cultura
  • João Baptista Teixeira

Numa época em que a família tem sido vitimada, há muito para refletir. Seu desastre é causa direta das dificuldades visíveis de nossa sociedade. A família deve ser sacudida pela própria situação e chamada ao debate, não na condição de vítima mas de envolvida, como participante de primeira grandeza tanto da derrocada quanto da recuperação de nosso mundo. Já será um grande passo na medida em que se começa a resolver os problemas quando se os discute.

Meu melhor amigo de juventude pertencia a uma família que mal chegava à condição de classe média, posição que conquistaria mercê do esforço de cada um dos filhos em idade de trabalho. Era uma família numerosa, que hoje diria santa, em que se podia sentir o perfume das virtudes cristãs e da laboriosidade. À época estudava em Porto Alegre e só passava os finais de semana em Montenegro. Só convivia com meu amigo no sábado á noite e no domingo porque ele trabalhava num supermercado e só folgava no dia em que Deus descansou na criação do mundo. Tenho hoje escassas notícias desta família mas sei que todos estão muito bem, coroando uma união exemplar, sem devaneios televisivos, nunca conjugando o verbo amar no pretérito. Com limitações econômicas visíveis, sempre superadas por silencioso esforço, aquela família escreveu belas páginas, algumas das quais li com discreta admiração.

Quem não vive isolado e não é surdo está sempre a escutar excertos da vida alheia. Sem qualquer intuito de bisbilhotice, fica-se sabendo de uma ou outra passagem sobre a vida de pessoas que sequer conhecemos, literalmente na linha do escutei sem querer. Porém, cada vez mais raramente se escuta algo que não nos faria preferir a surdez. No mais das vezes as narrativas envolvem conquistas ou carências materiais. Como se não fosse possível ser feliz com pouco.  De fato não é, num modelo que reduz o homem à condição de máquina, que rouba de cada um a alegria de vencer as mazelas da vida, que jamais nos deixarão por muito tempo.

Na época em que convivi com aquela família o canto do cisne do socialismo ainda se fazia ouvir. Como sempre, as idéias chegavam por aqui com grande atraso, preenchendo o vazio ideológico num país pouco habituado a pensar com os próprios neurônios. Quem visse aquela família poderia imaginá-la como solo fértil para pregações com a semente da discórdia social. Porque é sempre mais fácil jogar a culpa no lado de fora da porta e aprumar um discurso rancoroso. No final do século XIX, bem antes da revolução comunista de 1917, o papa Leão XIII já diagnosticava na encíclica Rerum Novarum o drama que se avizinhava com a solução socialista:

 “Os Socialistas, para curar este mal, instigam nos pobres o ódio invejoso contra os que possuem, e pretendem que toda a propriedade de bens particulares deve ser suprimida, que os bens dum indivíduo qualquer devem ser comuns a todos, e que a sua administração deve voltar para os Municípios ou para o Estado. Mediante esta transladação das propriedades e esta igual repartição das riquezas e das comodidades que elas proporcionam entre os cidadãos, lisonjeiam-se de aplicar um remédio eficaz aos males presentes. Mas semelhante teoria, longe de ser capaz de pôr termo ao conflito, prejudicaria o operário se fosse posta em prática. Pelo contrário, é sumamente injusta, por violar os direitos legítimos dos proprietários, viciar as funções do Estado e tender para a subversão completa do edifício social.”

Os modelos socialistas que saíram do papel caíram de podre quando o vento outonal da história soprou com mais força. Mas o contraponto do socialismo também não era santo e mergulhamos novamente no materialismo. Só trocamos de roupa de banho mas o tranpolim do rancor e da inveja era o mesmo. Aquela família que sigo admirando não perdeu tempo nem com uma nem com outra vertente. De olhos serenos, seus membros não tinham tempo para dissipações e sem qualquer exibicionismo seguiam a vida com fé e oração. Sem revolta ou desmedidas ambições.

Lembro deles quando vejo tanta cizânia nas famílias, mal disfarçadas nas frustrações por conta de desejos que nunca se realizarão. De qualquer forma tudo isto não tem relevância e a quem não estiver ainda convencido da frivolidade da busca material, sugiro que responda onde estarão em um século os bens que acumulou. Quanto às famílias, o que conta não é seu bem estar econômico mas o espírito que deveria regê-las. Quando vejo algumas famílias desajustadas e seus filhos em notório sofrimento, inseguros em meio aos infelizes bate-bocas, penso que os pais deveriam responder uma pergunta simples: eu gostaria de ter nascido no lar que criei?

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