Decorria o ano de 1843, quando na Amadora, no dia 15 de Junho, nasceu uma menina, no seio duma família de origem nobre, a quem puseram o nome de Libânia do Carmo Galvão Mexia de Moura Telles e Albuquerque.
A epidemia que nos anos de 1856-57 grassou no país, levou-lhe os pais e órfã com apenas catorze anos, ingressou no Asilo Real da Ajuda, orientado pelas filhas da Caridade francesas.
As Ordens Religiosas tinham sido proibidas pelo governo liberal português desde 1833, e em 1862, as suas protectoras também foram expulsas de Portugal e remetidas para França.
Libânia do Carmo é então convidada pelos Marqueses de Valada para viver em sua casa, aí permaneceu cinco anos, onde foi muito estimada e tratada como filha.
Todavia, a sua vocação para ajudar os pobres e os desvalidos e o seu grande amor pelos outros, leva-a a abandonar a vida faustosa que lhe proporcionaram, decidindo entrar para o Pensionato de São Patrício, onde veio a conhecer um ardente pregador apostólico – o Padre Raimundo dos Anjos Beirão, que se torna seu orientador espiritual.
Aqui contactou com as Capuchinhas de Nossa Senhora da Conceição, religiosas da Ordem Terceira de São Francisco, que se dedicavam à educação de meninas pobres, as mais miseráveis de Lisboa.
Como naquela época não era possível professar em Portugal, por se manter a proibição de emitir votos religiosos, D. Libânia do Carmo professou particularmente e tomou o nome de Irmã Maria Clara do Menino Jesus.
Recorre à Congregação francesa das Irmãs Hospitaleiras e Mestras e em 1870, um pequeno grupo de senhoras, sob a orientação da Madre Clara, parte para França, de onde regressa em Maio do ano seguinte, com o noviciado feito e a profissão canónica emitida.
Num país depauperado pelas guerras liberais, por maus anos de agricultura e sem a ajuda do Clero e das Ordens Religiosas, que tinham sido suprimidas e expulsas, uma multidão de pobres e famintos, doentes e órfãos, numa pobreza agravada pela industrialização crescente e desenfreada, que conduzia a uma forma de escravatura e de degradação humana, todo o proletariado abandonou a sua terra, para em Lisboa procurar uma vida melhor.
Face a tamanha miséria e à crise profunda que se fazia sentir, o Padre Beirão sonhava com uma Congregação genuinamente portuguesa que se ocupasse destes desvalidos da sorte, vítimas de ideologias catastróficas e devastadoras. Com a Irmã Maria Clara funda a Congregação das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição (CONFHIC) a qual obteve a aprovação pontifícia em 1876. Nomeada Superiora Geral e considerada sua fundadora, dois anos mais tarde, após a morte do Padre, assume totalmente o seu governo e, num espaço de vinte anos, alargou-a não só a todo o país, como ainda a Angola, Índia, Guiné – Bissau e Cabo-Verde.
Creches, escolas, colégios, hospitais, casas de assistência a inválidos e a crianças, fizeram da fundadora uma “pioneira da acção social portuguesa “ e das Missões femininas.
Contratempos históricos, crises violentas, perseguições e difamações, também fizeram parte do historial desta Congregação, que acabaria por ser extinta em Outubro de 1910, pelo governo revolucionário republicano. De Tui e de Bombaim vêm convites para as acolher e a sua expansão não pára de acontecer: Brasil, Moçambique, Açores, Itália, S. Tomé e Príncipe, Estados Unidos, Filipinas, África do Sul, México e Timor, perfazem os catorze países onde a Congregação continua a apostar em seguir o ideal duma freira portuguesa.
A Irmã Maria Clara do Menino Jesus, foi uma personalidade marcante e preponderante. Portadora duma postura extremamente suave, serena, humana e educada, de temperamento doce e firme, reflectindo o seu rosto a ternura e a misericórdia de Deus.
O seu grande e sensível coração fez dela um espírito sem fronteiras, na ânsia de remediar as carências dos pobres, mitigar as suas dores e sofrimentos, tendo unicamente por objectivo a premência da caridade.
Envolta em fama de santidade, esta órfã, de nobre ascendência espanhola, depois duma vida inteiramente dedicada a fazer o Bem onde fosse necessário, partiu para o Céu no dia 1 de Dezembro de 1899.
Figura gigantesca pelo modelo de vida numa era difícil, a bem-aventurada Madre Clara poderá ser um exemplo de magnanimidade e de grandeza de vontade em tempos de crise espiritual, de ausência de vocações com fortes convicções, em que urge voltar a fazer frente à fome, a todo o tipo de miséria e ao egoísmo que grassa à nossa volta.
Se as épocas de crise são também épocas de santos, Deus permita que este exemplo seja um lançar de sementes para muitas e santas vocações.
Quando Deus quer e o homem reza e sonha, a vocação nasce e muitas boas vontades podem voltar a acontecer.