Outubro de 1917: o golpe de estado bolchevique significou bem mais do que a queda do czarismo e a subida ao poder de um grupo de políticos idealistas. A revolução liderada por Lenine tornou-se o ícone que representaria o começo de uma nova era para a humanidade, anunciando uma sociedade mais justa e um homem mais consciente da sua relação com seu semelhante. Novembro de 1989: a queda do Muro de Berlim e a consequente abertura dos arquivos dos países comunistas revelaram a derrocada final do sonho comunista.
O LIVRO NEGRO DO COMUNISMO traz a público o saldo estarrecedor de mais de sete décadas de história de regimes comunistas: massacres em larga escala, deportações de populações inteiras para regiões sem a mínima condição de sobrevivência, expurgos assassinos liquidando o menor esboço de oposição, fome e miséria provocadas que dizimaram indistintamente milhões de pessoas, enfim, a aniquilação de homens, mulheres, crianças, soldados, camponeses, religiosos, presos políticos e todos aqueles que, pelas mais diversas razões, se encontraram no caminho de implantação do que, paradoxalmente, nascera como promessa de redenção e esperança. Os autores, historiadores que permanecem ou estiveram ligados à esquerda, não hesitam em usar a palavra genocídio, pois foram cerca de 100 milhões de mortos! Esse número assustador ultrapassa amplamente, por exemplo, o número de vítimas do nazismo e até mesmo o das duas guerras mundiais somadas.
O terror – o Terror Vermelho – foi o principal instrumento utilizado pelos comunistas para a tomada do poder e para a sua manutenção.
Um olhar retrospectivo leva-nos a concluir que no século XX se deram grandes catástrofes humanas: duas guerras mundiais, o nazismo, tragédias mais circunscritas, como as da Arménia, Biafra, Ruanda e outros países. Com efeito, o Império Otomano entregou-se ao genocídio dos arménios, e a Alemanha ao dos judeus e dos ciganos. A Itália de Mussolini massacrou os etíopes.
O comunismo insere-se também neste tempo histórico transbordante de tragédias, chegando mesmo a constituir um de seus momentos mais intensos e mais significativos na medida em que preexistiu ao fascismo e ao nazismo e que sobreviveu a eles, atingindo os quatro grandes continentes. Um comunismo bem real, encarnado por líderes célebres – Lenine, Estaline, Mao, Ho Chi Minh e Fidel Castro, entre outros, que cometeu crimes contra a humanidade, contra o espírito, contra a cultura universal e contra as culturas nacionais.
Estaline ordenou a demolição de centenas de igrejas em Moscovo, Ceaucescu destruiu o coração histórico de Bucareste para construir edifícios e traçar perspectivas megalomaníacas, Pol Pot fez com que fosse desmontada pedra por pedra a Catedral de Phnom Penh e abandonou à selva os templos de Angkor, durante a revolução cultural maoísta, tesouros inestimáveis foram destruídos ou queimados pelas Guardas Vermelhas.
À ignorância – desejada ou não – da dimensão criminosa do comunismo juntou-se, como sempre, a indiferença de toda a humanidade.
Terminada a Primeira e, em seguida, a Segunda Guerra Mundial, o mundo estava ocupado a curar as chagas, a ultrapassar as dificuldades e a erguer-se das suas próprias ruínas.
A participação dos comunistas na segunda guerra e na vitória sobre o nazismo fez triunfar definitivamente a noção de antifascismo como critério de verdade da esquerda, e, certamente, os comunistas como os melhores defensores desse antifascismo. Com o nazismo vencido, designado pelos Aliados como o “Mal Absoluto”, o comunismo saltou quase que mecanicamente para o campo do Bem. A vitória sobre o nazismo deveria supostamente fornecer a prova da superioridade do sistema comunista.
Na Europa libertada do jugo nazi, surgiu um vago sentimento de gratidão para com o Exército Vermelho (do qual não se teve que suportar a ocupação) e de culpa em face dos sacrifícios suportados pela população da URSS, sentimentos que a propaganda comunista não hesitou em manipular a fundo. Paralelamente, as modalidades de “libertação” feitas pelo Exército Vermelho no Leste Europeu permaneceram amplamente desconhecidas no Ocidente. Nessa triste Europa Central, significou somente a troca de uma noite por outra, dos carrascos de Hitler pelos de Estaline. Após 1945, o genocídio dos judeus apareceu como o paradigma da barbárie moderna, chegando mesmo a ocupar todo o espaço reservado à percepção do terror de massa no século XX e os comunistas compreenderam toda a vantagem que podiam tirar de um tal reconhecimento, recorrendo ao símbolo do antifascismo.
Numa sociedade mundial supermediatizada, onde a imagem – fotografada ou televisionada – foi a única a merecer crédito da opinião pública, não dispomos de fotos de arquivo sobre os locais de crime do comunismo.
Os vencedores de Nuremberga puderam fotografar e filmar à vontade os milhares de cadáveres do campo de Bergen-Belsen, onde também foram encontradas fotos tiradas pelos próprios carrascos, mas nada de semelhante ocorreu no mundo comunista, onde o terror era organizado no mais estrito segredo.
Nos tempos hodiernos, algumas ideologias procuram “apagar” a História, retirar a memória do passado e cortar as raízes da Humanidade.
O recurso a algumas inverdades, a distorção obstinada de certos factos históricos seduziu alguns historiadores, cineastas e escritores levando-os a reconstruções livres, de alguns episódios históricos ou de algumas épocas. Também a sua propaganda e manipulação chegou aos manuais escolares, campo fértil para se disseminarem ideias tendenciosas e reconstruir um passado que não existiu daquela forma.
Duplo dever, para com a memória e a história, será o de repor a Verdade na sua abrangente e real totalidade.
Texto inspirado n’ O Livro Negro do Comunismo – Crimes, Terror e Repressão – BERTRAND BRASIL