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33 dias?

  • Setembro 30, 2022
  • Religião
  • José Maria C. da Silva André

Ao fim de 33 dias de pontificado, justamente há 44 anos, no dia 29 de Setembro de 1978, o Papa João Paulo I morreu. O dia 28 decorrera intensamente. Levantara-se às 5h00 da manhã, como habitualmente, para rezar; celebrara a Eucaristia; recebera muitas pessoas; interviera em muitas decisões; fizera algumas pausas para rezar na capela e aproveitara o corredor comprido para caminhar um pouco, de um lado para o outro. Depois, imprevistamente, durante a noite, sofreu um ataque cardíaco fulminante e morreu.

É verdade que tinha uma saúde frágil e problemas cardíacos, mas o ritmo intenso de trabalho não fazia pensar num desfecho tão próximo. O periódico italiano «Il Sabato» publicou uma entrevista com um irmão do Papa, em que revela que ele tinha estado em Portugal com a Irmã Lúcia e ela o teria prevenido de que seria eleito Papa e morreria pouco depois. É difícil confirmar esta informação e, seja como for, não é importante.

O mundo inteiro, assistira com surpresa à eleição de João Paulo I, porque os jornais tinham profetizado, cheios de convicção, a possível eleição de vários cardeais, mas não tinham reparado no Cardeal Luciani. As primeiras homilias do novo Papa, as suas catequeses em diálogo com as crianças, as histórias encantadoras que lhes contava, causaram impressão, mesmo em ambientes afastados da Igreja. Depois do pontificado de Paulo VI, cada vez mais doloroso, corroído pela persistente crise religiosa e por uma cruel oposição à Igreja, o povo simples correspondeu ao sorriso descontraído e aberto de João Paulo I com uma adesão calorosa e espontânea.

Muitos começaram a ler os livros que o Cardeal Luciani tinha escrito, em particular aquela colecção de artigos muito originais intitulada «Ilustríssimos Senhores», de cartas ficcionadas a personagens da história e da literatura. Nesse formato divertido, percebia-se a profundidade e a cultura do novo Papa.

Até o escudo papal manifestava o seu humor característico. Como queria continuar a obra de João XXIII e de Paulo VI, juntou o leão de Veneza (símbolo de João XXIII) com uns montes (porque Paulo VI se chamava Montini) e umas estrelas (porque ele próprio se chamava Luciani, isto é, luzeiros).

Em poucas semanas, algumas sacristias bafientas começaram a reagir. Com veneno e maledicência, atribuíam a humildade de João Paulo I à falta de preparação intelectual. «O que é que ele terá para dizer, quando se acabarem as suas histórias para crianças?».

Evidentemente, era impossível reformar a Igreja em 33 dias. No entanto, foi isso que aconteceu, porque Deus intervém na história, para além das possibilidades humanas. O Cardeal Luciani tinha valiosa obra escrita, mas, como Papa, não teve tempo de publicar nenhuma encíclica, deixou apenas algumas homilias, uns poucos discursos aos peregrinos e as catequeses às crianças. À escala humana, tudo isto é ínfimo; nas mãos de Deus, não tem limite. Em 33 dias, deu-se uma surpreendente conversão dos corações. Gente que parecia empedernida, abriu-se à graça. Nunca se saberá bem porquê.

Assistimos por todo o mundo a milagres deste calibre, que motivaram numerosos bispos a pedirem a abertura da causa de canonização de João Paulo I, convencidos de que ele era santo. João Paulo II aceitou a proposta em 2003, dando-se início às investigações históricas e ao exame minucioso de toda a vida de João Paulo I. Um dos testemunhos ouvidos foi o de Bento XVI, na altura já Papa emérito. A segunda fase consistiu no estudo de uma cura absolutamente milagrosa alcançada por intercessão de João Paulo I, ocorrida em Buenos Aires, quando o actual Papa Francisco era o Bispo da diocese. Finalmente, o processo culminou no passado dia 4 de Setembro, com a solene beatificação de João Paulo I na Praça de S. Pedro.

Pode-nos parecer que uns poucos dias não chegam para mudar o mundo, mas Deus tem outra opinião. Um santo, nas mãos de Deus, sobra sobejamente.

Quando João Paulo I morreu, os jornais voltaram a informar, sempre com grande certeza, que cardeais poderiam ser eleitos. Curiosamente, esqueceram-se de mencionar Karol Wojtyla, então Cardeal de Cracóvia, que quis chamar-se outra vez João Paulo, em memória daqueles 33 dias que mudaram o mundo.

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