Se podes conservar o teu bom senso e a calma
No mundo a delirar para quem o louco és tu…
Se podes crer em ti com toda a força de alma
Quando ninguém te crê…Se vais faminto e nu,
Trilhando sem revolta um rumo solitário…
Se à torva intolerância, à negra incompreensão,
Tu podes responder subindo o teu calvário
Com lágrimas de amor e bênçãos de perdão…
Se podes dizer bem de quem te calunia…
Se dás ternura em troca aos que te dão rancor
(Mas sem a afetação de um santo que oficia
Nem pretensões de sábio a dar lições de amor)…
Se podes esperar sem fatigar a esperança…
Sonhar, mas conservar-te acima do teu sonho…
Fazer do pensamento um arco de aliança
Entre o clarão do inferno e a luz do céu risonho…
O poema SE – “IF” – escrito pelo prêmio Nobel Rudyard Kipling, no ano de 1895 (publicado em 1910), mesmo o longo tempo decorrido, mostra-se contemporâneo, pela lucidez de seus versos e pela certeza de que tudo se repete, ao sopro da nossa inconstância (inerente ao ser humano).
Quantos erros contigo carregas? Quantos arrependimentos em tua tão curta existência? SE durássemos 200 anos, os desacertos se repetiriam pelos 71.200 dias de sua duração temporal. Realmente vivemos num mundo a delirar… Sou eu o louco? Certamente, na concepção dos outros; mandaste o bom senso às lonjuras e a calma muito tempo a recuperar.
Se guardas lembranças do passado, por favor recorde quantos os desafetos perdoaste? Ainda temos vivo em nossas recordações, os males a nós feitos. Ao término de um filme, no cinema Tanópolis, saindo em fila, no espaço junto à parede esquerda, fui empurrado pelos que vinham atrás. Projetado por sobre um casal à frente, sem nenhum questionamento prévio, levei um sonoro tapa, na altura do ombro e parte do rosto.
Fui ao chão, acudido pelos amigos; conhecia muito bem o autor do imerecido tabefe. Guardei comigo uma repulsa inconsciente, que emergia cada vez que o enxergava. Se tivesse ouvido minha explicação, entenderia e evitaria o impensado ato. Nunca tive a afetação de santo para o perdoar, por não ter recebido um pedido de desculpa em recíproca. Hoje, tudo faz parte do meu calvário: dos males que sofri e dos que pratiquei.
Ainda posso aguardar pela esperança (ao menos a do Grêmio voltar para a série A). Se tudo fosse diferente, como seria? se não aguardasse em um dia qualquer, do mês de setembro de 1964, defronte ao Café Comercial, não teria visto a saída das meninas do São José, ao descer a lomba da Igreja. Certamente aos meus olhos a imagem da Nereida não chegaria.
Se não tivesse ido ao baile no Salão Schmidt, lá no Porto dos Pereiras, não teria dançado com a Nereida e iniciado o namoro, dado causa ao noivado e posterior casamento. Por tudo, o correr das estações já transparece 58 anos de profícua vida em comum. Se as lágrimas de amor não fossem abençoadas com o perdão, a singular ruptura teria determinado o fim.
“Sem receares jamais que os erros te retomem/ quando já nada houver em ti que seja humano/ Alegra-te, meu filho, ENTÃO SERÁS UM HOMEM”. Assim encerra o poema. Os SEs permeiam nossa vida; os tantos que respondemos e superamos são capazes de determinar nossa própria qualidade. Somos o que plantamos… Pelo tempo restante, ainda continuaremos a plantar.