Em águas que correm Um rio, saudades!
Um rio serpenteia Tarde quentes de verão
Divide a terra, rasga o solo A nadar em suas águas
Por margens definidas. Pescar nas suas barrancas
Saudades, lembranças!
Aos olhos da imaginação
Descortino… Os guris
Num mundo mágico
Ao longo do rio … O rio da nossa juventude.
A escadaria ao rio, lá perto do mirante fronteiro ao prédio do Frigorífico Renner, era conhecida como “escada da banha”. Lá pelo andar dos anos 50 do século passado, ficava o melhor lugar para pescar lambari – mas bota lambari nisso e não esses mirradinhos de hoje em dia, o pessoal anda pescando e fritando, ao invés de deixar crescer. Outra coisa: não se pescava lambari com boia; os que a utilizavam eram chamados de principiantes e inexperientes. O negócio era sentir o peixe puxar e com calma fisga-lo, como quem não tivesse fazendo nada. Tudo na maciota. Em pouco tempo se fazia uma boa fieira – um galho com uma forquilha na ponta, onde os peixes eram espetados.
No auge da produção, naquele local, saindo do alto prédio do frigorífico, havia uma tubulação de ferro, por onde passavam os pacotes de banha, devidamente encaixotados e eram carregados nos barcos. No barco ficavam empregados que aparavam as caixas, já que à beira-rio a tubulação terminava num acentuado declínio. Estes caixotes eram empilhados no porão do barco, rumo ao porto de Rio Grande, onde seguiam mundo a fora.
Por este mesmo local, passava um cano subterrâneo, despejando no rio uma substância líquida, que acreditávamos ser restos de banha, servindo de alimento aos peixes. Os lambaris proliferavam naquele local: descida da banha ou escada da banha.
Foi justamente ali que eu aprendi a nadar. Dava pé na beirada, mas logo adiante era fundo. No verão, quase todas as tardes, íamos tomar banho no rio. A maioria dos guris ia escondida e antes de ir para casa tinha que secar bem os calções, que eram postos por baixo das calças, ou levados em mãos, escondidos. Vejam o contrassenso: hoje em dia os pais pagam para os filhos aprenderem a nadar e acham graça. Naquele tempo a gente aprendia de graça, nas águas rasas do rio, como o “Baixio Velho” e o Balneário Afonso Kunrath. No cais só se tomava banho nos lugares permitidos e rasos, quando não houvesse barco em processo de carga e descarga.
Os mais antigos sempre alertavam: “Cuidado com o rio”, “Com água não se brinca”, frases corriqueiras que sempre ouvíamos. Os pais de filhos adolescentes demandavam um cuidado muito maior; descoberta a proeza, umas lambadas de cinta ou vara era certo. Com a promessa de não nadar mais no rio, os ânimos acalmavam; até a repetição e nova descoberta.
A nós outros, contemporâneos de então, a escada da banha está impressa em nossa memória. Mas, havia outros locais de banho, menos perigosos. Correndo ao longo do campo do Operário FC, desviando pelos fundos dos terrenos fronteiros à rua Capitão Porfírio, Campo do FC. Montenegro, indo adiante, uma bela sanga, corria por toda a extensão.
Córrego de águas límpidas e fundo coberto de areia (muitas a buscavam e utilizavam em construções); alguns lugarzinhos mais fundos possibilitavam nadar. Aos fundos, onde hoje é a casa da Tuca, o local era apropriado; depois, por uma entrada, entre duas casas, na Porfírio, o lugar de banho era especial. Esta entrada era utilizada por carroceiros para retirar areia da sanga.
Era uma vez um rio… Era uma vez uma sanga, ao longo da cidade! Um rio que continua a fluir… em busca de permanente proteção; o nosso rio não é um depósito de lixo; lembrem-se “água é vida”; como tudo, é finito. A sanga, o “duto” comeu.