Há pessoas que conhecem pessoas. Eu conheço uma senhora. Eu conheço uma senhora incrível e não consigo evitar vir aqui falar dela. Mesmo que os leitores não a conheçam, tenho a certeza que conhecê-la um bocadinho, aqui, nestas pobres palavras, vos fará bem.
Eu conheço uma senhora elegante e doce que me acolhe no seu olhar como se eu já lá estivesse há tanto tempo. Sabe aquelas pessoas que têm olhares tão doces, tão limpos, que só com o olhar nos fazem sentir em casa? Eu conheço uma senhora assim. Melhor, hoje tomei um chá com ela, na sua casa, na sua sala, com as suas chávenas, com as suas compotas, com o seu bolo e, naquele slowliving de que agora tanto se fala, mas que tão pouco se pratica, ouvi as suas histórias, fiz-lhe perguntas e deixei-me encantar ainda mais.
De facto, o que dá charme às pessoas, ás situações, pode ser a casa, o ambiente, as flores, mas nada dá mais encanto do que o tempo. Ter alguém que tem tempo para estar conosco com calma, sem ter de atender telefones, sem ter uma reunião daqui a dez minutos. Ter alguém bem arranjado, com cuidado e apuro no que nos prepara, que nos ouve e que nos deixa entrar na sua alma.
Por estes dias, ninguém tem tempo para nada. É obrigatório ter mil coisas para fazer, sair de uma para se meter noutra, ocupar todos os buraquinhos, ter planos para todos os fins-de-semana, almoços, jantares, reuniões. Nem pensar em ter tempo livre, não vá alguém pensar que o mundo não quer saber de nós. Nada de parar, não vá começar a sentir o vazio da própria alma.
Que delicia encontrar uma senhora de oitenta e tantos, que conhece as histórias e a História, que sabe segredos nada secretos de cozinhados de sempre, que fala de Alexandre Herculano e de Fernão Lopes, e que, no meio dos seus afazeres, tem tempo para estar, falar, ouvir, estar mais pouco, servir um chá, uns biscoitos e estar mais um pouco.
Pode dizer-se que esta senhora tem este tempo porque já é velhinha e tem os filhos criados, e não tem uma grande carreira profissional à sua espera, nem mil sítios para visitar, no entanto, estas aparentes verdades inquestionáveis não mascaram o facto do tempo e da entrega aos outros ser mais um estado de alma do que uma etapa da vida.
Realmente está na moda não ter tempo, mas realmente, no final das contas, o que mais importa é ter tempo para ter tempo e perceber que esse tempo só faz sentido quando é para acolher os outros, fazê-los felizes, demorar o olhar, falar pausadamente, gesticular com carinho e elegância e não ter medo de se dar, de se enganar. A maior generosidade nada tem a ver com os objetos. A maior generosidade é o tempo.
Hoje estive com uma Senhora. Uma Senhora assim. Queria tanto ser assim.