Eu conto, segundo contado foi
Os contos despertados
Pela imaginação popular
Muitos reais, outros conjecturados
Se foram ou não… Lendas contadas
Fizeram parte daqueles que
Viveram a um tempo, por este lugar.
Os anos corriam pelo início de 1970. De repente, em certa noite, duma sexta-feira qualquer, quando os alunos dos cursos noturno do São João deixavam as dependências da escola, tiveram a atenção despertada por um grande alarido. Defronte ao prédio da Cadeia Municipal, pessoas assistiam a prisão de um cidadão. O homem estava muito alterado, alardeando o seu infortúnio e infelicidade. Nada o aquietava; resmungava, gritava e esperneava.
O Delegado era uma pessoa muito boa e só recolhia pro “boi preto” em caso de última necessidade. O “boi preto” ficava no porão, debaixo da escada do prédio da atual Secretaria de Obras. A polícia foi chamada ao Café Líder, onde toda algazarra começou. Dali até a Cadeia foi um desatino. O detido fora acometido de uma crise passional de ciúme, por um amor platônico. Assim disseram.
Já formado e amigo do cunhado do cidadão, fui contratado para assumir a defesa. Nada difícil; o delegado ponderou: assim que o detido se aquietasse, o liberaria sob minha responsabilidade. E aconteceu. Foi liberado e o cunhado levou-o para casa, depois de muita conversa.
Naquela noite adentrei nas dependências da cadeia. Tão logo recebi um pedido: “Me dá um cigarro aí!”. A quase ordem veio de uma cela e o solicitante, o cidadão conhecido popularmente por CABELEIRA. Era um alguém folclórico, popular em nossa cidade; um homem moreno, cabeludo e perigoso quando bebia. Na verdade o Cabeleira foi um pequeno, mas contumaz estelionatário. Uma comparação com lendário “Pedro Malasartes”.
Pois um dia, estando com fome, o Cabeleira resolveu telefonar para o Irineu Frank, conhecido por “Amigo da Onça”, dono do Café Líder; fez-se passar pelo Dr. Campos, médico local e grande filantropo. Disse que estava autorizando o fornecimento de almoço e janta para o Cabeleira, por estar trabalhando em sua casa. Depois passaria para pagar. Alertou bem que as refeições deveriam ser acompanhadas de aperitivo e vinho, do melhor.
Na época, a palavra do Dr. Campos era uma ordem e o Irineu prontamente atendeu. Por uns dois ou três dias o Cabeleira comeu e bebeu do bom e do melhor. Depois desapareceu. Passados alguns dias, o “Amigo da Onça” procurou o Dr. Campos para acerto. Foi então que percebeu o logro. No dia da ligação, nem em Montenegro o Dr. Campos estava. Como o Amigo da Onça era altamente pão-duro, o ilustre médico se apiedou e pagou a despesa, Evitou a choradeira.
Outra vez, o Cabeleira adentrou no Armazém do avô do Chico Motos e pediu uma garrafa de cachaça. Mostrou o dinheiro e o seu Braun apanhou a garrafa e pôs no balcão. Para disfarçar, o Cabeleira pediu uma pedrinha de isqueiro, que ele sabia estar numa gaveta aos fundos. O seu Braun foi buscar. Então o Cabeleira aproveitou e trocou a garrafa, por outra que trazia escondida. Quando o seu Braun voltou, disse que a cachaça não era da sua marca e estava quente. Iria procurar em outro lugar e também deixaria a pedrinha de isqueiro. Só mais tarde o seu Braun descobriu ter sido logrado. A garrafa estava cheia d’água e com tampinha de cerveja.
Outra: Ele ligou para a Delegacia e pediu que viessem buscar o Cabeleira que estava na praça ofendendo as mulheres que passavam. Pedia que levassem o Cabeleira para o “boi preto” da Cadeia e deixassem lá por um tempo, até se aquietar. Os policiais vieram e o levaram. Na cadeia ele ganhou comida e uma boa cama. Era justamente o que queria. Até hoje não se sabe onde ele conseguia o telefone para ligar.