Quando ela dança
Se livra da máscara mundana
Deixa para trás seus sapatos, seus compromissos e suas preocupações
Desliza para dentro do veludo e da exaltação
E deixa sua pele envolvê-la gentilmente
Como uma luva sobre sua alma (Artur F).
“Divertimentos em Montenegro de antigamente, além das festas de Igrejas, só existiam nas comemorações de aniversário e nos saraus, onde se fazia música, cantos e declamações. Mas isto era privilégio das famílias ‘apatacadas’, como se dizia na época. O povo ficava aglomerado diante da casa onde se realizava o sarau, assistindo de longe, sem poder tomar parte na reunião e por esta razão os ‘apatacados’, que se divertiam batizaram os que ficavam na rua de Convidados do Sereno” (In Montenegro Antigo, Crônicas de Brederodes, organizado por Glaci Daudt; p 18).
Pois, já fui um Convidado do Sereno; adolescente, convivendo com uma turma de amigos, com os quais mais tarde fundamos o “Clube Ibiá”, não podia frequentar os clubes sociais, salvo o Operário, onde meu pai era sócio e da diretoria. Os colegas e amigos iam aos bailes e eu permanecia defronte aos clubes, observando o movimento e ouvindo a música.
Tempo de carnaval, véspera de completar 14 anos – proibida a entrada em baile noturno, desacompanhado. Restava o baile infantil. Fui com meus amigos até a frente do elegante clube dos “endinheirados”. Todos entraram e eu fiquei sentado na escada que conduzia à porta principal. Dali podia observar as meninas que chegavam, quase todas em belas fantasias. Era grande a movimentação de pessoas; as crianças sempre acompanhadas de um adulto.
Não recordo quem, mas sei que foi uma senhora, cliente da loja, que deve ter observado o meu olhar extasiado por toda aquela beleza. Ela falou com um membro da diretoria; ouvi claramente a expressão: “filho do Arno”, pedindo permissão ao meu ingresso no baile infantil. Não demorou muito; o Cardona apareceu na porta de entrada, chamou-me e permitiu que eu entrasse e participasse do baile.
Lembro, que o Toninho Luft (não sócio) estava ali comigo e igualmente foi convidado a entrar. Primeiro visitamos a boate; fiquei deslumbrado com o ambiente. Um amplo salão, com paredes revestidas em madeira, o bar e a cozinha. Uma sala fechada que disseram ser o local do jogo de cartas. A pista de dança era guarnecida por quatro grossas colunas, também em madeira revestidas; os banheiros e a cancha de bolão. Senti-me em outro mundo.
Subindo dois lances de escada chegava-se ao salão principal. Quantos bailes observei e a música ouvi, sentado num banco da praça. O salão era amplo; aos fundos o palco da orquestra, pelos outros três lados cadeiras e mesas dispostas em fila. Elas eram guarnecidas por toalhas brancas e sobre as quais repousavam sacos de confete, rolos de serpentina, leques e máscaras, além dos copos e garrafas de bebida.
Na parte fronteira à rua, o salão guardava um amplo mezanino, com uma espaçosa copa, onde homens tomavam cervejas e outros “drinks. No salão crianças pulavam, brincavam e se divertiam ao som das marchinhas carnavalescas. Este foi o primeiro contato de um Convidado do Sereno com o Clube Riograndense: Eu próprio.