Pois bem! Sou como um menino,
sentado à beira de um rio, com algumas pedras na mão.
Volto ao tempo de incerteza, de raiva, de medo…
Volto a ser aquele que lança as pedras!
E me perco do que as recolhe… (Álvaro de Azevedo).
Lá pelo final do ano de 1949, quando vim morar, definitivamente, em Montenegro, por um bom tempo nossa família ficou na casa dos avós Kauer. Era na Dr. Flores, a duas quadras do rio. Seguido íamos, minha mãe e eu, no Atacado do seu Livino Schüler. Por vezes, era levado à beira do rio; do alto do Cais, jogava pedras na água. Queria chegar mais próximo, mas a dona Luiza não deixava; tinha medo.
Me perdi no tempo; somente depois dos 12 anos, voltei à beira-rio; agora para tomar banho, na escada do Renner. Ali aprendi a nadar e a pescar. Já não atirava mais pedra; deixava-me envolver pela água, do rio no seu manso correr. Tomar banho no rio era uma aventura escondida, ao conhecimento dos pais… Até ser descoberta.
Beira-rio, residência da família Carpes Azevedo, havia uma fábrica de vinagre e engarrafadora de vinho/cachaça, de propriedade do Major Castro, tio do Ênio de Freitas e Castro. O vinagre era produzido a partir da fermentação do bagaço de milho. Segundo dados, o vinagre era de ótima qualidade e muito apreciado.
Vinagre de milho não se encontra mais por ai (a produção de frangos é tão acelerada atualmente que não sobra mais milho para fazer vinagre). Antigamente o vinho era vendido em garrafões e em garrafas de 650 ml; o vinho envasado em garrafas mais sofisticadas – corriqueiras nos dias atuais – mas bastante caro. O de beber, no dia-a-dia, era engarrafado em vasilhame comum.
As engarrafadoras compravam o vinho em grandes tonéis; destes recipientes as garrafas eram envazadas, fechadas, rotuladas e seladas. O vinho do Major Castro chamava-se “São João”. O seu Lauro Bender (pai do compadre Lolo), herdou a fábrica/engarrafadora e deu continuidade no negócio. Ele próprio fazia a praça, vendendo os produtos no comércio local e na colônia, especialmente a zona do campo – região em que se bebia muito vinho – na zona de colonização alemã a bebida preferida era a cerveja e a serrana (aperitivo feito de cachaça, limão, mel e canela).
O Lauro Bender foi um dos montenegrinos pioneiros na colonização do noroeste paranaense. Foi um dos fundadores da cidade de Londrina, em cujo município adquiriu grande área de terras, depois de encerrar as atividades da sua empresa em nossa cidade. O seu Lauro era uma pessoa muito culta, dado à leitura, Ele, depois de alguns anos em Londrina, passou vendeu as terras e voltou para Montenegro, onde foi trabalhar no Frigorífico Renner – lá permaneceu até sua morte.
A casa na Rua Álvaro de Moraes (antiga 7 de Setembro) esquina com a João Pessoa, foi construída ou reformada por Rolf Becker. Nos fundos da casa, entre esta e o engarrafamento havia um muro de divisa. Certo dia, a Marli, filha do Rolf, foi caminhar por sobre o muro e caiu do outro lado, dentro da caixa onde eram estocados os cacos de vidro das garrafas quebradas. Dava quase dois metros de altura e ela não sofreu nenhum corte – ela contava 4 anos de idade. Dizem que criança cai mole, pois não sente o perigo e por isso não se machuca.
A beira-rio, atual Porto das Laranjeiras, foi palco de inúmeras festividades – a maior aconteceu em 1904, por ocasião da inauguração dos Cais (alto e baixo); outra festa que merece ser mencionada foi a da simbólica chegada dos colonizadores de nossa terra, por ocasião do Centenário de Montenegro. Beira-rio revitalizada; recebe a todos de braços abertos, sob os auspícios das águas do rio.