Há três tipos de rios amazônicos:
os de águas brancas, como o Purus e o Madeira;
os de águas claras, como o Tapajós;
os de águas negras, como o rio Negro.
E há três tipos de mata amazônica:
mata de igapó, que está sempre alagada, com árvores mais baixas e muito cipó e lianas;
mata de várzea, que tem inundações periódicas;
mata de terra firme, que quase nunca é inundada, onde estão as árvores de maior porte.
Nestas regiões o serviço de combate à malária é mantido pelo DNRU, Departamento Nacional de Endemias Rurais.
Segundo Laurindo e o Walfredo, esse pessoal é um bando de cafajestes. Os preventivos e remédios, que devem ter distribuição gratuita nestas bandas miseráveis, são vendidos. Se o caboclo não tiver uma galinha ou outra coisa para dar, também não tem remédio.
Passamos por Manicoré e um pouco antes da foz do rio Marmelos vimos um barco recreio que encalhou no sábado e até agora não pôde sair. Ele entrou em um banco de areia, numa hora em que o prático foi dormir.
O barco está lá encalhado, já meio de lado e perigando emborcar. Só é possível soltá-lo com um barco maior que o puxe pela popa. Os passageiros foram evacuados e levados por outra embarcação. No barco só ficou o dono, com o desespero estampado no rosto pálido.
No Ferreira o sr. Santero vai constantemente sondando a profundidade do leito.
E em noite sem lua não se viaja.
Não é fácil a vida na Amazônia.
Laurindo me contou que ao longo do Purus a lepra é muito comum.
É uma doença terrível e o caboclo tem até medo de falar seu nome, para não atraí-la.
Assim, tem gente que vê a doença aparecer em uma mão, por exemplo.
A pessoa encobre a mão com uma luva, pra ninguém notar. E nunca dirá que é lepra.
”Que nada, é uma besteirinha qualquer…”
A noite passada foi terrível, ninguém dormiu. Por causa dos carapanãs.
Os bichos furam até as redes e o tecido das roupas pra sugar a gente. Ficamos nos revirando, dando tapas no escuro até de madrugada, quando partimos novamente e o vento afastou a mosquitama.
Estamos no sétimo dia desta viagem subindo o Madeira. O rio se tornou de navegação mais problemática.
A época é de vazante, as águas baixam e vão aparecendo ribeiras de areias douradas.
Segundo o alagoano, o cenário é o mesmo ao longo dos outros rios amazônicos.
Embarcações com seus tripulantes, práticos e cozinheiros, carapanãs e piuns.
Um barco que transporta passageiros é um recreio.
Um barco de dois andares é dito motor com passadiço.
E tudo de madeira.
Já houve barcos de casco metálico por aqui, há muito tempo atrás, no boom da borracha.
O comércio é um roubo. Trazem coisas da zona franca de Manaus e cobram o que bem entendem.
Na vazante do rio as praias ficam à descoberto.
Aí vêm as tartarugas de todos os tipos e colocam seus ovos, que os ribeirinhos coletam.
Tracajás.
A Piraíba é um peixe enorme, compete com o Pirarucu em tamanho e peso, pode alcançar 3 metros de comprimento e pesar mais de 200 quilos.
Volta e meia alguns botos assomam e desaparecem.
As águas do rio vão se tornando cada vez mais barrentas.
Na margem esquerda começam a aparecer alguns poucos terrenos cultivados. E bananais. O resto é floresta.
O caboclo nordestino quando vem, se interna na mata, na busca da borracha e da castanha.
O pessoal da ribeira é de caboclos amazônicos, moram em cabanas de palha. Vivem assediados pelas enchentes, mas não trocam a praia pelo barranco.
Recentemente o governo militar interditou o garimpo, que sempre houve muito nestas bandas, para reservar a exploração dos minerais às grandes empresas multinacionais. Há uma grande evasão de garimpeiros.
Um caboclo se aproximou da gente com sua montaria cheia de jirimum, maxixe, tomate, banana e peixe, seu Ferreira comprou de tudo.
Agora sim, Walfredo levantou da rede e começou a preparar aquele almoço.
Com seu ar meio malicioso de quem sabe que é importante.