Será que a fé cristã se torna mais acessível nas celebrações litúrgicas fundamentais: Ascensão, Pentecostes, SS. Trindade e Corpo de Deus? Cristo no Evangelho relaciona-as intimamente com a transcendência cristã. A comunhão de vida com as três pessoas divinas, um Deus único, resume a fé cristã vivida na relação pessoal integral, divina-humana, celebrada nestas festas, elevando a natureza humana por Cristo incarnado para a comunhão-amor-ação trinitária. Tenho, com frequência, breves tertúlias informais com um professor de Filosofia em que ele repassa diversas posições de filósofos sobre Deus.
Ficam sempre questões de um lado e do outro. Não pretendo resumi-las. São tentativas de solucionar os problemas da existência da vida humana de ontem e de hoje. Estimulam a refletir sempre mais e a enfrentar a insegurança e dúvidas de tantas posições.Parece não haver nenhuma noção, ideia não abordada por filósofos, teólogos, cientistas, crentes e ateus. Mas não é bem assim; a identidade e percurso humano-divino de cada pessoa são únicos. E as dúvidas voltam sempre com a questão: como é possível que haja cristãos de fé comprometida e sincera e ao seu lado, céticos, agnósticos e ateus sinceros na sua descrença, indiferença e dúvidas?
Surpreende que haja entre eles, aqueles que, a certa altura, dão um salto qualitativo nas suas posições, sinceras e mantidas ao longo de anos, e se convertam ao Cristianismo e à Igreja católica? E comecem a viver de tal modo em coerência com nova identidade e pertença que não retrocedem, embora se alternem neles, consolações, desolações e dúvidas, estados de alegria, sombras e noites escuras.
Os leitores já estarão a entrar, silenciosamente, nesta tertúlia virtual, com as suas experiências religiosas cristãs e questões pessoais. E se fosse em tertúlia real seria interessante ouvi-los. Em muitos dos relatos impressionantes dos que deram saltos destes, as experiências de conversão apresentam, com frequência, entre outras, duas facetas inesperadas.
A pessoa, que antes se esforçou por puxar dos seus galões de conhecimentos eruditos excecionais e aplicá-los aos problemas religiosos da sua vida para os resolver, esbarrava com limitações e aspetos insolúveis, mesmo com recurso de apoio a outros autores. Agora pode bastar um instante. Os pensadores são dos que mais fazem revisões reflexivas sobre crenças religiosas cristãs.
O problema central é o da transcendência da qual os dicionários dão dezenas de significados. Um deles é aceitar a abertura para a vida além da morte, a ressurreição, e que não está nas possibilidades do homem. A literatura, incluindo a de sites online, apresenta centenas (milhares?) de convertidos famosos que viveram o rasgão da transcendência, mas o número é incalculável e ainda mais se contarmos os que passaram por um processo gradual de conversão e os não eruditos.
O leitor que experimente fazer algumas consultas, a começar por S. Paulo, S. Agostinho, Blaise Pascal, Alphonse Ratisbonne, Edith Stein, Chesterton, Thomas Merton, Vittorio Messori ou aqueles «10 ateus que mudaram de autocarro»; e milhares vindos de diversas religiões; sem esquecer que as crianças também se convertem ao Deus-amor.
Jesus Cristo na sua vida temporal anunciou repetidas vezes que ressuscitaria e prometeu dar o seu corpo como alimento de vida eterna. A transcendência de vida eterna não é científica, nem irracional. Celebra-se nas solenidades cristãs, como única transcendência que satisfaz à ânsia humana de vida eterna. Jesus, Pessoa divina assumiu a natureza de homem, morreu, ressuscitou e ascendeu ao Alto vivo. Inseriu todos os homens no corpo de que Ele é a Cabeça e prometeu a ressurreição aos que confiam e entram na relação de amor com Ele, o Pai e o Espírito Santo.
O amor entre Ele e o Pai e o Espírito Santo antes, durante e depois da Incarnação e Ascensão também nos envolve e a todos, seus irmãos. É um amor de fé, um agir incarnado, com a única prova das boas obras feitas com o corpo-coração aos mais carenciados (cf. Mt. 24, 31-46). A vida cristã é inseparável da fé no amor-ação de Jesus (Deus e homem) e do nosso amor-ação pelos mais pequeninos. Não há cristãos ou católicos não praticantes; privariam Deus e os seus irmãos do bem feito com o seu corpo-coração.
Antes de aceitar o triângulo: fé, amor e bem-fazer, com Deus, os convertidos deixam de confiar só nos seus dotes de eruditos; dão o comando da sua vida, nalgum dos mil modos de se render ao Senhor, como acontece nos instantes de sabedoria luminosa e pneumática, mais densa que a de qualquer génio humano superinteligente.
O Espírito ilumina a transcendência cristã, brecha do tempo-eternidade, e o crismado exclama no silêncio de êxtase: Ahhh! No corpo ou fora do corpo? Já espiritual? Não sabe, mas agora vê, ama e age o bem. Ainda homem pecador no vale de lágrimas pede perdão, e, a caminho da santidade-“divinização”, celebra o Pentecostes do Pneuma (Amor) trinitário em que vive as sementes de ressurreição.
Funchal, Pentecostes