Nosso autor de hoje não é conhecido no Brasil, entretanto, trata-se de um poeta, narrador, ensaísta, tradutor e crítico literário reconhecido e recompensado com numerosos prêmios.
Referimo-nos ao espanhol Antonio Colinas que nasceu em 1946 em Leão, no noroeste da Espanha e a pouco mais de seiscentos quilômetros da fronteira portuguesa. Sua obra sempre está aberta a outras culturas, por isso tem um claro e profundo sentido de universalidade e ao mesmo tempo esse trabalho sempre proporciona raízes em sua terra natal.
Fiel à fusão entre a experiência de viver e a experiência de escrever, entre a poesia e a vida, a sua obra literária só assim pode explicar o seu conhecimento de vida, o que acontece por longas estadas em diversas áreas culturais, nas quais aprende e com as quais dialoga, como no sul da Andaluzia (Córdoba), Madrid , Milão (Itália), Ibiza (Ilhas Baleares), ou Salamanca.
Colinas viveu na Itália entre 1970 e 1974, anos em que trabalhou como professor visitante e professor de espanhol nas Universidades de Milão e de Bérgamo. Viveu vinte e um anos na ilha de Ibiza, entre 1977 e 1998, então totalmente dedicado a seu trabalho como escritor e tradutor. Algumas de suas obras têm um tom mais pessoal, como seus livros de poemas ou os seus dois Tratados de Harmonia, nos quais o autor reconhece sua “filosofia de vida” naquele período insular. Durante o mesmo e até o momento, desenvolveu também um extenso trabalho jornalístico e de crítica literária em diversos jornais e revistas nacionais e estrangeiros.
No ano de 1971 casou-se com María José Marcos e tem dois filhos, Clara e Alejandro. Reside na cidade de Salamanca desde o verão de 1998, cuja estada representa um regresso a suas raízes vitais e criativas, a saber, as do noroeste de Espanha; e a qual combina com viagens frequentes a vários centros de Espanha e do mundo para divulgar sua palavra poética e suas ideias sobre a poesia. Sua obra recebeu numerosos prêmios e reconhecimentos, incluindo o Prémio Nacional da Crítica (1975), o Prémio Nacional de Literatura (1982), o Prémio Literário de Castela e Leão (1999) ou, em Itália, no mesmo ano, o Prémio Internacional Carlo Betocchi, premiado por seu trabalho como tradutor e estudioso da cultura italiana. Em 2005 recebeu o Prémio Nacional de Tradução, atribuído pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros italiano, pela sua tradução da Poesia Completa do Prémio Nobel Salvatore Quasimodo (1901-1968; Nobel de 1959).
Entre os anos de 2007 e 2008, houve a exposição biobibliográfica Antonio Colinas, chamada “Quarenta anos de literatura”; nessa ocasião, além do Catálogo correspondente, foram publicados os livros “Sobre o contemplar” e o “Itinerário de Antonio Colinas, que inclui toda a bibliografia do autor. Nos últimos cinco anos, Colinas intensifica suas chamadas “missões pedagógicas”, transmitindo sua palavra em centros educativos e culturais em Espanha e no estrangeiro; embora sempre esteja próximo das “raízes” de sua terra, o autor tem continuado seu trabalho nos meios de comunicação social, quer praticando crítica literária, quer expondo e discutindo artigos de opinião. Também percorre longos itinerários em encontros internacionais como o Hay Festival de Cartagena das Índias (Colômbia, 2013), ou a Feira do Livro de Guadalajara (México).
Recebeu a Medalha do Senado da República do México pela relação cultural que mantém com esses país. Sua relação com as culturas do Extremo Oriente também continua intensa, como durante a viagem à Índia para participar da homenagem internacional que este país dedicou aos escritores Tagore e Vivekananda; ainda, pela terceira vez, o autor se desloca à Coreia do Sul, como convidado deste país para participar no I Encontro de Poesia Asiática (2017). E, brevemente, Antonio Colinas será um dos integrantes das festividades na Casa do Japão de Salamanca por ocasião dos 150 anos de relações entre este país e Espanha e do VIII Centenário da Universidade de Salamanca.
Nos últimos dois anos, foram publicados seis novos livros sobre a obra do autor, e esta tem sido motivo de novos reconhecimentos em 2014, em 2016, em 2017, em 2019. Em 2020, 2021 e 2022, foram realizados três Cursos de Verão programados pela Universidade de León em torno de três temas monográficos sobre o autor: Origem e universalidade, Novos gêneros, novos caminhos e Da poesia à narrativa e ao ensaio. Como acabamos de expor, a obra deste autor é riquíssima, pujante de sabedoria e de uma poesia plena de emoção.
Passamos a um poema exemplar que o autor nos proporciona; intitula-se “Litania do cego que vê”. Que este pão celestial do firmamento / me alimente até meu último suspiro. / Que estes campos tão ferozes e tão puros / Sejam bons para mim, melhores a cada dia. / Que se no verão minhas mãos incendiarem / com cardos, com urtigas, que ao chegar o inverno / Sinta-os como geada em meu telhado. / Quando parecer que caí, / porque eles me derrubaram, / Estou apenas ajoelhado no meu centro. / E se alguém me bater com muita força / sinta apenas a brisa do pinhal, / o murmúrio / da fonte serena. / Que se a vida é um fim, / como um cata-vento, / cantando no topo, / lá em cima que eu me acalme para sempre, / minha âncora que se dissolva no azul. / E se alguém, de repente, viesse me arrancar / Quanto semeei e plantei chorando pelas nuvens, / Me tornei uma nuvem, me tornei uma planta, / que sejam ainda sementes meus dois olhos / nos olhos sem lágrimas do cachorro. / Que se houver doença / que sirva para curar-me, / Que seja somente o início de meu renascimento. / Que se eu beijar e parecer que o lábio tem gosto de morte, / que o amor vença a morte nesse beijo. / Que se eu render minha mente e detiver meus passos, / que se eu fechar a boca para te contar tudo, / e parar de esfregar sua carne já semeada, / E se eu fechar os olhos e vencer sem lutar / (vitória na qual nada sou e nada obtenho), / Tenho você, silêncio do topo, / ou esse sol abatido que é a neve, / onde nada é tudo. / Que eu respire em paz a música inédita / que seja meu último desejo, pois como sabem / que, para quem respira em paz, todo mundo / Está dentro dele e nele respira. / Que se a morte insistir, / que se a idade avança e tudo e todos / ao meu redor parecem estar indo embora rapidamente, / que me venha o mundo finalmente nessa luz / que explode. / E que seu fogo / me vá desmoronando como / chama / de vela: suavemente, lentamente, muito lentamente, / como giram acima em êxtase os planetas.
Eis um poema que nos faz meditar; aproveitem a ocasião. Um abraço de Feliz Natal a todas e a todos, e boas realizações no Ano Novo!