Sou entre flor e nuvem,
estrela e mar. Por que
havemos de ser unicamente
humanos, limitados em chorar?
Não encontro caminhos fáceis
de andar. Meu rosto vário
desorienta as firmes pedras
que não sabem de água e de ar – (Cecília Meireles).
No Poema do Adeus, Miltinho canta: “Caminho o meu caminho e nos lugares que passei/ As pedras no caminho são o pranto que chorei. Para boa análise da suposta controvérsia, permito uma apreciação: o verso de introito deixa transparecer uma verdade cristalina para nós humanos: em nosso caminho a dor e a tristeza nos marcam invariavelmente, de forma permanente; somos limitados em chorar, marcando com pedras a trajetória. O verso de introdução sugere alternativa.
Viajei ao passado e lembrei! Num barco/hotel, navegando pela imensidão d’água do Pantanal, tive um surto de crise do pânico … Sequer sabia o que era? Tudo fruto da solidão e do medo de morrer, tão longe dos meus familiares. A taquicardia, formigamento nos membros inferiores e a queda da pressão arterial pareceu-me um infarto. O medo piorou a crise.
Não pensei na nuvem nem na flor; tão pouco na estrela ou no mar, conforme o verso de Cecilia Meireles. O que marcou, e guardo até hoje comigo, foi a dor, o medo, as coisas negativas. Prejudiquei a mim e meu parceiro de pesca. Por que semear pedras pelo caminho, se elas são inanimadas, incapazes de ouvir e responder? Pedras não sabem de água nem de vento.
Desde criança, férias na orla atlântica, sempre em Tramandaí, praticamente traduzia necessidade essencial. Não passava janeiro sem que, por uma semana, nos hospedássemos no Hotel Strassburger, na rua Emancipação, na chamada Capital das Praias. A longa caminhada até o mar, sentar-se na fina areia, ser fotografado e a foto inserta em um pequeno monóculo, para lembrança, faziam parte desse curto veraneio.
Hoje tenho um apartamento junto à Avenida Beira-mar; só atravessar a artéria asfáltica e já alcanço a faixa de terra e o mar. Do apartamento diviso as ondas quebrando em branca espuma, com a água beijando a fina areia que se estende pela grande dimensão do litoral norte. A mim, a visão do mar tranquiliza; sou um pisciano e a água meu habitat natural.
Caminho pela areia, molhando os pés na salgada água, dimensionando o horizonte ao longe vislumbro, curvado sob o azul do céu. Por sorte, o destino permitiu chegar a uma provecta idade e continuar minha trajetória rumo ao mar, nos meses quentes do verão gaúcho. Comigo, a Nereida, os filhos e netos, completam o quadro tridimensional a que cotidianamente experimento: a morada, a areia e o mar.
Sigo porque a vida impõe o seguir; pelo caminho vou alegre, satisfeito, esperando o transcurso dos dias. As ondas quebram; a água do mar chega e retorna ao grande manancial. As ondas traduzem a vida, com suas oscilações elevadas, depois correndo e espalhando pela areia a brancura de sua espuma.
Os dias passam céleres e nós seguimos juntos; o importante é dar o passo segundo o tamanho das pernas. O adágio é certo, ao menos para a maioria: “A pressa é inimiga da perfeição”. Por mim, que de perfeição nada busco, a pressa é inimiga das minhas.