Viver assim: sem ciúmes, sem saudades,
Sem amor, sem anseios, sem carinhos,
Livre de angústias e felicidades,
Deixando pelo chão rosas e espinhos
(Antero Tarquínio de Quental).
Recolhi alhures, que: “A vida é uma sombra errante; um pobre comediante que se pavoneia no breve instante que lhe reserva a cena, para depois não ser mais ouvido. É um conto de fadas, que nada significa” – Shakespeare.
Somos projetados pela luz; a luz elimina a escuridão, torna tudo visível e nos permite ver o caminho. Na escuridão somos apenas um corpo; podem nos ouvir, mas não enxergar. Vamos em busca da luz, por mais tênue que seja; pelo caminho, sombras errantes sempre nos acompanham, mesmo que em sonhos ou fruto da nossa própria imaginação.
Muitas vezes somos colocados em situações delicadas, a exigir uma resposta, um posicionamento. Por nosso pensamento vagam sombras, itinerantes pela dúvida… Por certo que a vida é um grande Palco; somos os atores de comédias e dramas; por momentos somos os falantes principais, por outros os coadjuvantes… Quem poderia narrar nossas idiossincrasias comportamentais, ante as emoções intimas que conosco guardamos, sem lhes dar voz? Evidente: nós próprios.
Num tempo, que já vai longe no passado, a Alta Ramiro era povoada por residências familiares, com inúmeras crianças, as quais ganhavam o espaço da rua nas noites quentes. Jovens se reuniam; a praça propiciava encontros, com o desfilar das meninas ao seu entorno. Os matinés, balas no bolso e a procura de uma namorada.
Assim a vida desenvolvia, com encontros e desencontros emocionais. Por este tempo, um amigo meu (in memoriam), conheceu o grande amor de sua vida – no seu dizer. Só que esqueceram de dizer-lhe que o amor é dedicação, confiança e perseverança. A moça, ao menor desvio de olhar, especialmente ao encontro de um rapaz, a tragédia emocional do ciúmes brotava instantamente.
Rompidos os laços, meu amigo ia tomar alguma coisa mais forte, para afogar as mágoas. De tanto afogar ficava “chuco” e, neste estado de espírito as lágrimas e os impropérios aumentavam de proporção. Na medida em que a comoção etílica arrefecia, o arrependimento chegava.
Se o horário permitisse, seguia em busca do perdão e o reatar do namoro. Chorava, se lamentava, prometia por juras nunca mais repetir o ignominioso ato da ruptura e juntos começariam uma nova caminhada. As invocações eram de um singular brilho artístico; de agressor mudava para vítima e, de tanto insistir, finalmente conseguia o perdão. Assisti uma cena assim e quase acabei chorando junto e endossando o pedido de escusa.
As repetições eram constantes; um dia a moça tomou rumo da Capital e definitivamente o namoro chegou ao fim; começou o tempo dele procurar novo amor; um dia, finalmente, o encontrou e a vida em comum durou até a sua partida para outra dimensão.
O ciúmes possessivo é agressivo, fugindo do natural de qualquer relação. Filmes dramatizam o sentimento intenso de posse; na própria vida real, o ciúmes é a dramática causa aos feminicídios. Ainda durante a intensidade do amor (ou paixão), de repente a assertiva: “quero o divórcio” chega aos ouvidos.
Lá se vai a linda história de amor, sem que você tenha percebido sua grande carga de culpa pelo inusitado do desfecho. O latente ciúmes ganha proporção e as consequências podem ser nefastas. E assim a vida continua e juntos seguimos.