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Chamados das periferias de misericórdia para o centro

  • Maio 3, 2025
  • Religião
  • Padre Aires Gameiro

As leituras do Domingo da Misericórdia apresentam Pedro e João a aproximar-se dos doentes e frágeis; e João preso em Patmos chamado para escrever às periferias da Igreja. No Evangelho é Jesus Cristo ressuscitado que vai ao encontro dos apóstolos medrosos e fechados; e de Tomé quase ressentido por Jesus se mostrar aos colegas na sua ausência. Ferido e amuado como figuras de alguns automarginalizados?

Será que a Igreja só foi chamada para a missão de procurar os das margens, frágeis e feridos da vida, em tempos recentes? Neste Jubileu de 2025 celebramos as origens de dois mil anos de Igreja durante os quais sempre teve essa missão. O Evangelho é um convite e chamamento duplo de chamar para o Centro pessoas que possam chamar outros das suas fronteiras para Jesus.

Contemplar mais assiduamente o Evangelho tem por objetivo contemplata allis tradere, isto é, a levar aos outros as coisas contempladas no centro, como diria S. Tomás. A memória do passado do centro da Igreja, que é Jesus, é fundamental para delinear o futuro em cada época. Não se pode esquecer o passado. Quem é que não se lembra da frase que o Papa Francisco foi buscar a S. Beda para o seu escudo de bispo? Descreve a essência do chamamento de S. Mateus, alguém aparentemente posto de lado e indigno de ser chamado: miserando atque elegendo, compadecendo-se leva Jesus a escolher Mateus para apóstolo.

Mateus era alguém das periferias de desprezados, de má fama e maus atos. Mas o Evangelho apresenta-nos mais casos gritantes de pessoas nas periferias a ser procuradas com compaixão. S. Lucas, com a sua sensibilidade de convertido da cultura grega e da profissão médica para Cristo, terá ficado de tal maneira tocado pelos gestos de Paulo, convertido, em Filipos, que se sentiu também chamado da periferia para o centro. E não omitiu as parábolas e os gestos de misericórdia de Jesus mais significativos de que foi tendo conhecimento e que investigou, como ele diz, junto daqueles que o viram, ouviram e por fim “comeram e beberam” com Jesus ressuscitado. Foi exímio na recolha e narração em excelente grego. A parábola de um «pai que tinha dois filhos» é um assombro. O mais novo revoltou-se contra o pai, exigiu a herança e partiu para a vida de estroina. Voltou destroçado e humilde. E o pai fez-lhe a vida num inferno? Desculpem. Qual quê? Nada disso, sem ele merecer, fez-lhe uma festa paradisíaca de príncipe quando o viu chegar, maltrapilho, da mais abjeta escravização. Foi demais, o pai excedeu-se, pensou o filho mais velho, que não aguentou. Nem tantos bons e fiéis filhos de hoje aguentariam.

Só o Deus Pai poderia exceder-se daquela maneira com um filho da periferia dos porcos. E o que fez com o mais velho, o bom, desiludido e queixoso? Ele, que nunca deixou o pai, mantendo-se sempre fiel ao seu lado. A parábola não o diz, mas podemos adivinhar: terá feito outra festa semelhante, de surpresa, como fez com o mais novo? Lucas, porém, não deixou escapar outras parábolas e gestos de nos fazer chorar. Aquela mulher foi mesmo apanhada em flagrante. Adúltera! Está perdida. Quem é que a pode salvar de ficar enterrada sob um montão de pedras? Foram encontrá-la na situação de pecado. Ficou ali no tribunal da praça do Templo à espera do pior desfecho do dilema posto a Jesus. Jesus “misericordiou-se” dela e escolheu chamá-la para o centro e mostrou que os das pedras justiceiras estavam tanto nas sujas margens como ela. Se ela aceitou ou não a chamada para o centro junto a Jesus não fica claro. Ela decidirá.

Os adúlteros das pedras já viviam a surpresa do que eram, afinal. Alguns iriam também decidir se aceitavam o chamamento de Jesus. E a parábola da única ovelha perdida de entre 100 até aceitou ser conduzida aos ombros do Bom Pastor!

Voltando ao Evangelho de Tomé, o descrente, Jesus não o abandonou à sua descrença. Foi à sua procura noutra oportunidade favorável. Estava com os outros apóstolos a curtir a sua deceção de não ter tido a oportunidade da mesma visita de Jesus ressuscitado. Já se terá disposto a não continuar com a sua teimosia: “se não vir, não acreditarei”? Quando Jesus se aproximou nem teve tempo para pensar muito (Jo.20, 25-29). “Tomé, põe aqui o dedo e vê as minhas mãos; aproxima a mão e mete-a no meu lado, e não sejas incrédulo, mas crente”. E logo disse: “Meu Senhor e meu Deus”! Voltou a estar no Centro com Jesus e os crentes. Jesus, a seguir, pensou nos que iriam estar noutras margens e não poderiam ter a mesma experiência de tocar para crer: tu acreditaste por veres, mas outros serão felizes por acreditarem sem tocar e ver. Acreditam apenas por ouvirem de outros que viram, há dois mil anos, e os chamaram, e oraram por eles. Muitos continuam a dizer: se não vir, se não tocar, o Ressuscitado não acreditarei. E o Ressuscitado dirá: vinde porque na necessidade me destes de comer, beber e agasalho; e sem me conhecerdes me amastes. Vinde!

Funchal, Dias da Misericórdia e de orações pelos chamados, 4 de maio de 2025/Aires Gameiro

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