No dia 3 de Novembro foi lançada em Lisboa uma reedição da obra “Repensar Portugal”, do padre jesuíta, Manuel Antunes, meu saudoso professor de Cultura Clássica, tal como de muitas gerações que passaram pelos vários cursos de Letras na Universidade de Lisboa.
A primeira edição, publicada em 1979, reúne os textos que o autor escreveu para a revista Brotéria, após o 25 de Abril de 1974. Porém, quase meio século volvido, o pensamento do Pe. Manuel Antunes continua a ser de extrema actualidade, pelo que pode ser considerada um “manual de mesa-de-cabeceira para políticos”.
Louvando o gesto revolucionário, o professor também alerta para os seus perigos e denuncia os aproveitamentos desviantes do ideal mais puro que a revolução anunciava não deixando de apontar para novas formas e ameaças de antigos e novos totalitarismos, de censura e inquisição.
No texto intitulado “Que democracia para Portugal”, afirma que “o passado não pode voltar e o presente não deve continuar”. Nesse artigo, aponta para os problemas do país na sua época. As assimetrias e os dualismos de fundo, “dos salários reais, demasiado altos uns, demasiado baixos os outros”.
“É o descrédito – terrivelmente perigoso – de uma classe política, pouco preparada, que rapidamente ascendeu e, não menos rapidamente está a declinar a olhos vistos, devido à incompetência, ao oportunismo, ao demagogismo e à excessiva partidarização dos seus quadros. É o desencanto ante o muito que se prometeu, no concernente à saúde, à educação, aos transportes, às assimetrias regionais, à habitação, ao nível e estilo de vida, à justiça social para todos, o muito que se prometeu e o muito pouco que se realizou em todos esses domínios”.
Descortinou e previu os perigos que ameaçam a consolidação e a durabilidade da democracia: a corrupção, o individualismo, o partidarismo ou egoísmo partidário, a ânsia do poder, do ter, relativizando qualquer desvio ético ou moral que, eventualmente, pudesse vir a pairar e a denegrir uma aparente presença de serenidade, segurança e confiança.
“A democracia é necessária traduzi-la, pelo esforço de todos – mas sobretudo daqueles a quem assiste maior responsabilidade política, social, económica e cultural – a democracia é necessário traduzi-la nos factos e nas instituições que objectivem e encarnem a Verdade, a Justiça, a Fraternidade e a Liberdade”.
Uma revolução política tem de conter no seu cerne honestidade, dignidade, decência, numa palavra ser essencialmente uma “Revolução Moral”, em ordem a promover solidamente a “interiorização da democracia”, do seu sucesso ao longo do tempo em prol dos cidadãos.
Não pode conter no seu seio comportamentos políticos pautados pelo infantilismo e pelo primarismo, que geralmente descambam em decisões prejudiciais para o bem do povo.
Para o autor do livro Repensar Portugal é imperioso “interiorizar os valores da democracia” para elevar o comportamento moral da Nação, no interior do ser humano, no contexto social e no mundo.
Estado e sociedade civil, pessoas e comunidades, todos são chamados à ideia de “mudança”, como acto de consequências duráveis e não apenas promessa populista… Na política, na economia, na sociedade e na cultura, o humanista aponta para a sabedoria das medidas graduais e, sobretudo, para o sentido da responsabilidade e da justiça.
Este livro foi, e continua a ser, uma obra profética. Repensar, denunciar, organizar e animar Portugal é um desafio muito útil e oportuno que o Professor Manuel Antunes nos oferece para acalentar o que designa como um “Projeto-esperança para Portugal”.
Projeto de um país em progresso adiado, que deve ser repensado e reactualizado hoje, aqui e agora, pois Portugal não é um projecto acabado, mas um país em permanente necessidade de (re) construção, em direcção a um futuro que se deseja mais brilhante, mais luminoso e mais exemplar.
“Deus quer, o homem sonha, a Democracia nasce, mas Senhor, falta cumprir-se “Renascer Portugal”!