Joseph Ratzinger em criança.
No longínquo ano de 1221, reuniram-se em Assis milhares de frades franciscanos num encontro que ficou conhecido como o «Capítulo das Esteiras» porque, como não havia casas suficientes no lugar, os frades se instalaram no chão como puderam, sobre esteiras de palha. Foi nessa ocasião que S. Francisco de Assis e Santo António se encontraram pela primeira vez e S. Francisco encarregou o santo português de ensinar teologia aos frades. Foi nesse Capítulo que S. Francisco, o fundador, entregou o governo da Ordem a Frei Elias, para se dedicar a estabelecer o carisma fundacional.
O Capítulo das Esteiras foi um dos mais importantes, pelo menos um dos mais célebres da história dos franciscanos. Contudo, o que agora me trouxe este capítulo à memória não foram as decisões jurídicas ou organizativas importantes, foi um episódio curioso que sucedeu quase no final. Os frades receberam a notícia de que os bárbaros da Germânia precisavam de ouvir falar de Jesus Cristo e que alguém tinha de ir lá. Em princípio, quem lá chegasse seria morto, mas não se podiam abandonar aqueles povos sem lhes anunciar o cristianismo. Que avançassem os voluntários para a missão! Dezenas de frades prontificaram-se ir à Alemanha, plenamente conscientes de que seriam mortos, como tinha acontecido com os franciscanos que tinham ido evangelizar maometanos no Norte de África.
Foram seleccionados para irem à Alemanha Cesario da Spira como chefe, Tommaso da Celano, que haveria de escrever uma biografia de S. Francisco, Giordano da Giano, que escreveu a crónica desta expedição à Alemanha, e vários outros. Alguns sabiam latim, um deles entendia alemão. Não ia ser fácil explicar qualquer coisa aos alemães.
Os frades subiram de Assis até ao Norte de Itália, rodearam os Alpes e cansados, com frio e com fome, chegaram finalmente à terrível Germânia.
Quando só lhes faltava serem mortos, os franciscanos foram acolhidos de braços abertos, com enorme simpatia. A população ofereceu-lhes comida, pousada e ainda perguntaram se queriam que lhes construíssem um convento. Mas os frades ficaram sem saber como responder, porque naqueles primeiros anos da Ordem franciscana ainda não havia nenhum convento. Responderam que bastava um abrigo, perto de uma zona com água.
Tudo correu exactamente ao contrário do previsto: em vez do martírio, tiveram a melhor recepção de sempre!
As virtudes cristãs do povo alemão recordaram-me uma carta de 1934, escrita pelo menino Joseph Ratzinger então com 7 anos. A revista espanhola Omnes relata que Maria, irmã de Joseph, conservou a carta, que se descobriu durante os trabalhos de restauro da casa da família em Pentling, na Alemanha. Trata-se de uma carta dirigida aos Reis Magos, seguindo a tradição alemã de pedir ao Menino Jesus os presentes que se gostava de receber no Natal.
O pequeno Joseph começa a carta: «Querido Menino Jesus…». A seguir, pede três presentes: um missal, um ornamento litúrgico e uma imagem do Sagrado Coração de Jesus.
Talvez Joseph tivesse qualidades excepcionais, mas, quando uma criança de 7 anos pede três coisas como estas, mais do que admirar a criança, vem-nos ao pensamento a força cristã do ambiente familiar.
E, por associação de ideias, veio-me à memória o Capítulo das Esteiras. Realmente, há gente fantástica na Alemanha! O jovem Joseph Ratzinger, que viria a ser o Papa Bento XVI, teve uns antepassados muito simpáticos!