A matança dos inocentes é-nos contada no Evangelho de São Mateus. Os Magos haviam perguntado pelo rei dos judeus a Herodes, o qual ocupava o posto de rei dos judeus na época. Inseguro, inventa um estratagema para averiguar quem poderia ser aquele que, eventualmente, poderia usurpar-lhe o trono. Então, pediu aos Magos que depois o fossem informar do local, para também O poder ir adorar. Aconteceu, porém, que eles “regressaram por outro caminho”, e Herodes “ficando muito irado mandou massacrar, em Belém e nos seus arredores, todos os meninos de dois anos para baixo, o que segundo os seus cálculos e de acordo com o tempo exacto que havia indagado aos Magos”, acertaria na Sua extinção.
O que é certo é que esta crueldade é coerente com outras brutalidades feitas por ordem de Herodes: mandou asfixiar seu cunhado Aristóbulo quando este alcançou grande popularidade (Antiguidades Judaicas, 15 & 54-56), assassinou seu sogro Hircano II (15 & 174-178), outro cunhado, Costobar (15 & 247-251), sua mulher Marianne (15 & 222-239); nos últimos anos de sua vida, mandou assassinar os seus filhos Alexandre e Aristóbulo (16 & 130-135), e cinco dias antes de sua própria morte, um outro filho, Antipatro (17 & 145); finalmente, ordenou que, na iminência da sua morte, fossem executados uns notáveis do reino para que o povo da Judeia, querendo ou não, chorassem a morte de Herodes.
A passagem dos santos inocentes evoca outros episódios do Antigo Testamento: o faraó também havia mandado matar todos os recém-nascidos dos hebreus, segundo o livro do Êxodo, mas Moisés fora salvo – justamente aquele que depois libertaria o povo (Ex 1,8-2,10). São Mateus também diz que, com o martírio dessas crianças, cumpria-se um oráculo de Jeremias (Jr 31,15): o povo de Israel foi desterrado, mas o Senhor o tirou do exílio e, num novo êxodo, o conduziu à terra prometendo-lhe uma nova aliança (Jr 31,31).
O significado destas passagens parece claro: não importa o quanto os poderosos da terra tentem, pois eles não podem opor-se aos planos de Deus para salvar os homens.
Nos finais da década de setenta do século XX, em consequência da busca do desenvolvimento do poder como forma de conduzir a vida, de regular as populações devidamente disciplinadas, cuidando da sua saúde, higiene, reprodução, trabalho e produção, segundo os interesses do poder político, Michel Foucault utilizou o conceito de “Biopolítica”, na gestão da biologia nos cálculos e nos mecanismos de controlo da população pelo estado, como uma nova forma de “poder devolver à morte ou causar a vida”, valorizando primordialmente a existência do homem como força de trabalho, isto é, produção de valor económico. Neste contexto, uma vida só é útil enquanto for sã e produtiva.
Deste modo, torna-se possível legitimar a morte do “outro”, do doente, do degenerado, do anormal, do que já não serve, para que a sociedade fique mais limpa, mais saudável, mais sadia e mais pura.
Ao Estado é incumbida a função “assassina” através do biopoder, com pretenso recurso a legislação adequada que o converte em tanatopolítico sobre as multidões confusas, seres humanos que lentamente foram sendo adestrados por políticas de saúde, de alimentação, de educação sexual, de controlo de natalidade, de sucessivos atropelos à família, ao casamento, aos valores e à dignidade do ser humano, tudo em nome da liberdade.
Vejamos, por exemplo, a insistência no alargamento do tempo para o aborto, na legalização da eutanásia, na imposição da agenda ideológica na educação e na cultura, com recursos aos órgãos de informação e à televisão estatal, numa militância constante de fragmentação dos valores educativos, nomeadamente, na transmissão de filmes e de vídeos, supostamente pedagógicos, mas essencialmente manipuladores e colonizadores de ideias e conceitos distorcidos da sexualidade humana, da família e da sociedade.
Nas últimas décadas o Ocidente sofreu uma crise pandémica e parasitária de wokismo = doença desordenada do pensamento que avilta e destrói o significado das palavras, dos conceitos e das ideias, priva as pessoas de pensarem racionalmente e manipula o seu comportamento.
As teorias woke desenvolveram-se inicialmente nas universidades americanas, varrendo tudo à sua passagem: universidades, escolas, empresas, meios de comunicação social e cultura, facto que nos conduz a questionar como foram impostas, aceites e divulgadas com uma aparência snob de elitismo intelectual. Altamente preocupante na medida em que o seu contágio é de tal forma delirante que conduziu a uma loucura colectiva ou contágio mental.
Esta assombrosa violência política, social e psicológica foi tema do discurso de Javier Milei, Presidente da Argentina, em Davos, a 23.01.2025 –https://youtu.be/WyGMorQrHew?si=9CeFptTJkrW_QA1-