Muito cedo assistia matéria ao vivo da capital do estado quando a repórter lascou usabilidade … e um pouco depois castigou a audiência com caminhabilidade … É o resultado da tradução literal de anglicismos, como subversivos cupins que vêm devorando o cerne de nossa língua, este patrimônio tão maltratado que deve ser preservado pelas gerações.
Herdamos dos portugueses um país enorme, que se manteve unido em grande parte pela língua, nossa identidade primeira e maior. Sacrificá-la abre uma espinhosa vereda.
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As agremiações de futebol normalmente possuem uma identidade que as diferencia das demais e une torcedores. Corinthians e Flamengo são clubes do povo, o Palmeiras era conhecido como Academia por conta da categoria de seus jogadores, alguns dos quais davam aula de futebol, como Ademir da Guia, craque que flutuava pelo campo.
O time pelo qual sempre torci, no extremo sul do Brasil, tinha como identidade a raça, a luta. Tolerávamos até pernas-de-pau, desde que esforçados. Os malemolentes eram prontamente rechaçados e sua permanência era curta. Quanto aos formados nas categorias de base, pratas da casa, contavam com admiração ainda maior. Tinham amor à camiseta. Pelo menos é o que se imaginava.
Então entrou em campo a venda dos melhores jogadores para equipes européias. No início eram vendidos apenas os fora-de-série. Hoje até mesmo alguns medíocres conseguem ser expatriados … A qualidade de nossas equipes caiu muito e ainda cavam o buraco profundo das dívidas ao pagarem fortunas para jogadores que retornam ao país porque não encontram mais boas oportunidades em times europeus.
Meu time, dias atrás, foi escalado com seis estrangeiros e dentre os demais cinco nenhum fora formado pelo clube. O resultado é óbvio: perdemos a raça, a virilidade, que enalteciam as vitórias e vendiam caro as derrotas. Um torcedor arquirrival regional diz que nos sentimos ungidos … Pode ser. Com o óleo da luta.
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Dias atrás os veículos de comunicação estimularam uma comoção no Rio de Janeiro: a cantora norte-americana Stefani Germanotta, com seus 155 centímetros de altura, faria um show na praia de Copacabana. Assisti um filme em que atua como protagonista e gostei: Nasce uma estrela.
Como cantora, atende pelo nome de Lady Gaga e nada posso comentar porque não conheço uma única de suas canções. Deve ser boa no que faz, porque arrastou, segundo estimativas, centenas de milhares de fãs para o espetáculo noturno e gratuito na tão famosa praia carioca. Algumas entrevistas com os fãs que aguardavam um aceno da janela do hotel em que se hospedou revelava a idolatria pela artista. Em sua grande maioria não entendem mais que uma dúzia de palavras em inglês, mas estar lá e assistir um espetáculo desta magnitude é, para os tantos, como assistir o maior evento da Terra. Somos assim, creio. Estive lá! gritarão uns, Foi demais! proclamarão outros e os que não foram Não sabem o que perderam!.
Tudo certo, não fossem alguns exageros, como usar fralda geriátrica para assumir e manter lugares privilegiados desde muito antes de a ribalta iluminar-se.
Lady Gaga deve ser muito boa no que faz, mas o que escutei, desde então, como Judas, Abracadabra e LoveDrug são letras maçantes, gritadas com a parceria do velho estilo bate-estaca. Que me perdoem os fãs, mas trata-se de músicas perfeitas para academias de ginástica.
O que indago é como tais artistas se tornam sucesso num país como o nosso sem que isto signifique uma autopista de perda de identidade. Que vem de longe e vai a lugar algum.
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Também procede de um tempo já distante a fantasia esquerdista no seio da Igreja Católica. O texto de “Um homem torturado – Nos passos de frei Tito de Alencar”, cujas autoras não escondem simpatia pela esquerda, é primoroso para quem deseja conhecer melhor a colaboração de dominicanos com as ações terroristas da luta armada, sob a liderança de Carlos Marighella.
As lideranças estudantis, visceralmente comunistas, o congresso da UNE em Ibiúna, a prisão de centenas, os sucessivos sequestros dos embaixadores, pela ordem, norte-americano, alemão e suíço, soltos em troca da libertação de prisioneiros, o exílio, os atos institucionais e o erro maior da ditadura: a tortura.
Covarde, inominável, monstruosa e burra, o erro maiúsculo da tortura tem sido a lenha para as pregações da esquerda. Que posa de pacifista, a despeito de suas inspirações na década de sessenta incluírem “Guerra de guerrilha”, de Che Guevara, “Revolução na revolução”, de Regis Debray, “Por que resisti à prisão” e “Manual do guerrilheiro urbano”, de Carlos Marighella. Os movimentos comunistas não estavam pra brincadeira e nunca pararam. Omitir isto é faltar com a verdade ou, na melhor das hipóteses, uma demonstração de imperdoável ingenuidade.
O que seria cômico, não fosse trágico, foi a tentativa de conjugar marxismo e cristianismo, ou maoísmo e cristianismo.
“Ser revolucionário é ser solidário e participar de todas as lutas da classe operária, em todas as formas, segundo táticas tanto legais quanto ilegais, tendo em vista a tomada do poder, inclusive recorrendo à luta armada, se o permitirem as condições subjetivas e objetivas. Além disso, há todo um aspecto ideológico, humanista e utópico da revolução. A revolução é a luta por um mundo novo, um tipo de messianismo terrestre, no qual há possibilidade para os cristãos e marxistas de se encontrarem”. (Trecho de entrevista de Tito a um jornalista italiano em 1972)
Uma tolice que, em tempos do desastroso Concílio Vaticano II, encontraria eco na imaturidade, na incoerência e na arrogância de desconsiderar o comportamento de Cristo. Afinal, morreu na Cruz uma morte destinada a escravos, desapontando os zelotas.
A distopia comunista engambelou muita gente, catequizando incautos, como numa frase de Regis Debray: “Vencer é aceitar, desde o princípio, que a vida não é o bem supremo do revolucionário”.
Frei Tito tiraria a própria vida num convento francês.